Marechal Cândido Rondon (PR) – Entrevistamos durante o IX Encontro Ampliado da Rede Ecovida (EARE) o agricultor Isac Miola, da comunidade Dois Vizinhos, que fica no sudoeste do Paraná. Ele é um guardião de sementes crioulas na região sul, e vendeu mais de 230 unidades de sementes no encontro, que ocorreu em Marechal Cândido Rondon entre os dias 20 e 22 de abril. Aos 62 anos de idade, se preocupa com as sementes transgênicas que contaminam sua região e a conscientização das novas gerações sobre o tema. Na conversa, Miola fala sobre a importância desse cuidado com as sementes e seu trabalho.
Como você começou a guardar as sementes crioulas, ainda mais nessa região que tem muita soja e milho transgênico?
Desde criança tenho um pouco de interesse por uma coisa diferente, mas nunca foi muito forte. Isso começou mesmo em 2004 quando a ONG Assessoar promoveu a 2ª Festa de Sementes, fomos convidados e eu tinha só umas 40 variedades crioulas. Com o incentivo dessa organização consegui chegar à minha primeira festa de sementes com 80 variedades, e comecei a seguir esses eventos.
Você vai ampliando seu banco de sementes nessas feiras de trocas?
Nesses eventos a gente adquire mais variedades. Faz uns 10 anos que estou participando mais forte, porque é importante ter esse cuidado. Faço isso porque gosto e está difícil encontrar alguém que faça, então fazemos um trabalho que às vezes o agricultor não faz mais ou não existe. Tentamos salvar a pátria.
Tenho todas essas variedades de sementes dentro da minha propriedade, que tem 3 hectares de terra. É bem concentrado, eu planto um pouco de cada para manter e garantir o meu consumo. Trabalho hoje mais para isso, abandonei o plantio para ter renda só cuidando disso.
Você compra produtos no supermercado ou é auto suficiente?
Comprava uma parte dos produtos e outra produzia em casa, e não conseguia encontrar variedades para conseguir manter tudo 100%. Hoje eu já consigo gastar só com material de limpeza, e o que não tem na propriedade busco fora para chegar próximo a 100% meu consumo de orgânicos. Como a gente tem pouca terra, produz pouco.
Você tem passado às próximas gerações esses ensinamentos e visões de mundo?
Isso me preocupa bastante, porque o sistema que está aí não leva nada para isso e puxa para o outro lado. Lá no município eu sou meio sozinho, o pessoal não se interessa nisso. Sou o único produtor que tem o selo de agroecologia e com todas essas variedades na região. Lá tem muito milho e soja transgênica, que são trabalhados de forma convencional.
Você tem variedades mais típicas da região, ou é misturado?
O que eu mais tenho é feijão, cheguei a plantar 104 tipos, e peguei aqui no evento mais quatro variedades. Devo ter em torno de 290 variedades de sementes, e com o que eu peguei aqui deve chegar a 300. E tenho batata, mandioca, um monte de tubérculos, então deve ir a uns 350 tudo o que eu tenho lá em casa.
Você participa de algum movimento social?
Participo do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), porque nessa região estão previstas barragens na bacia do rio Chopim. Então a gente participa porque estávamos sendo ameaçados por elas, agora parece que mudou os projetos e a gente vai escapar. Mas mesmo assim a gente tem que participar. Na nossa comunidade éramos 18 afetados, e desses o único que não ia pegar água era eu. É importante, graças a esses movimentos que a gente conseguiu despistar os caras e eles mudaram de barragens grandes para pequenas. Assim não atinge o pessoal, se fosse a grande ia tirar um monte de gente da terra.