Por Laudenice Oliveira
O Sertão do São Francisco é um território onde os olhares do agronegócio estão atentos a qualquer movimento que coloque em risco o seu projeto de desenvolvimento. Esse setor ainda conta com o apoio governamental para fortalecer o seu projeto. Nesse território, agricultores e agricultoras familiares, indígenas, ribeirinhos entre tantos trabalhadores e trabalhadoras que vivem nessa região fazem um exercício diário de resistência a um sistema imposto que gera conflitos, doenças, descasos e mortes. Olhar o Sertão do São Francisco numa interface com os outros territórios foi um dos painéis do segundo dia do III Encontro Nacional de Agroecologia (III ENA), 17/05, para animar o debate Roberto Malvezzi, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Antônio Barbosa (ASA Brasil), facilitaram o momento.
Representantes de todas as regiões participaram do painel. Em todas as falas a indignação e a denúncia de quem vive em um país com um histórico de injustiça social. De Norte a Sul do país, os cuidadores e as cuidadoras da terra e das águas falam da dificuldade de defender as vidas.
“A devastação que tá aí é culpa do modo de desenvolvimento, que veio em nome do progresso. E, quando a gente veio acordar, já tava longe”, avalia o quilombola José Ribeiro de Souza, do Tocantins. A pescadora Ireni, de Remanso, da Bahia, denúncia o uso de agrotóxico pelo agronegócio na sua região.
“A gente tá clamando, porque o agrotóxico tá matando os peixes, e pescador precisa de território para trabalhar. O agrotóxico tá matando muita gente também de câncer”, denúncia ela. Já na Região dos Cocais, no Maranhão, as quebradeiras de coco são vítimas de empresários que exploram o seu trabalho. “Os empresários invadiram a região e as quebradeiras são obrigadas a negocia com eles para poderem trabalhar com o coco babaçu”, informa Francisca.
No Sertão do São Francisco, os perímetros irrigados para cultivo de frutas para exportação, a criação de hidrelétricas e agora com o canal do São Francisco são políticas desenvolvimentistas que favorecem os grandes e penalizam os pequenos. A agricultura familiar é colocada em segundo plano.
“Esta é uma região emblemática que há uma disputa de poder muito grande entre dois modelos de desenvolvimento. O Brasil é o único país no mundo que tem dois ministérios para as questões do campo. O MAPA (Ministério da Agricultura e Pecuária) e o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário). A problemática do setor da agricultura se expressa aí”, explica Roberto Malvezzi.
Das saídas – a agroecologia entra nesse campo de disputa, de fazer, inclusive, o convencimento de diversos segmentos de trabalhadores e trabalhadoras do campo para que apostem na produção de base agroecológica. Como diz o agricultor de Sergipe José Nobre ,“temos coisas muito grandes para discutir aqui”. Mas essas diversas coisas já estão em formação, que o digam as experiências de agricultoras e agricultores, de indígenas, etc.
O índio Amiraldo, do Acre, fala e dá exemplo da sua comunidade: “hoje estamos em cima da terra falando sobre biodiversidade. Nós somos as pessoas que vivem dentro da floresta e ela é viva. Nós somos preservadores, trabalhamos com a natureza, temos plano de gestão, fazemos manejo sustentável”, sentencia.
Lá fora – na plenária, a equatoriana Maria Quirai quis dividir com os brasileiros e as brasileiras presentes as angústias e violências também praticadas em seu país. “Nós também no Equador estamos sofrendo com esse modelo de desenvolvimento. A luta campesina vem sendo criminalizada pelo governo. Agora, há uma lei anti terrorismo, que é usada para prender camponeses que protestem. Estão querendo derrubar a lei criada em 2008, que proíbe a entrada de transgênico em nosso país. Lá não há política pública para o campo. A nossa luta social é no dia a dia”, denuncia Maria.