Proteste encontra ingredientes modificados em 23 produtos, mas apenas seis traziam essa informação na embalagem

 

 

Se os alimentos transgênicos são um assunto polêmico na área médica — até hoje não há um estudo definitivo sobre os benefícios ou prejuízos que eles podem causar à saúde —, na área da defesa do consumidor não existe dúvida: a legislação brasileira determina, por meio do decreto 4.680/2003, que qualquer produto que contenha mais que 1% dessa matéria-prima traga essa informação na embalagem. Entretanto, um levantamento inédito realizado pela Proteste — Associação Brasileira de Defesa do Consumidor revela que a maioria dos fabricantes, mesmo os que cumprem a lei, não imprime nos rótulos o selo que indica a utilização dos chamados Organismos Geneticamente Modificados (OGMs). O consumidor, em geral, compra um produto sem saber o que está levando para casa.

 

 

 

Foram avaliados em laboratório 44 produtos industrializados. O objetivo foi verificar se continham soja ou milho transgênicos em sua composição, bem como a quantidade destes. A Proteste também checou se os fabricantes divulgam essa informação nos rótulos. Em primeiro lugar, foram avaliadas as embalagens de todos os itens para ver quais traziam o símbolo de transgênico. Apenas seis continham tal informação: os biscoitos de milho Fofura, Yokitos, Doritos e Cheetos, e os complementos à base de cereais Maizena, Cremogema e Yoki Cremokrem Tradicional. O resultado foi considerado preocupante pela coordenadora institucional da Proteste, Maria Inês Dolci:

 

 

 

— Acho muito pouco, e esse resultado indica que não está havendo fiscalização. É mais preocupante porque o decreto (que estabeleceu a obrigatoriedade da informação sobre uso de matéria-prima transgênica nas embalagens) foi amplamente discutido com os fabricantes — afirma Maria Inês.

 

 

 

Todas as embalagens deveriam ter a informação correta

 


 

A segunda fase do teste visou a detectar a presença de soja ou milho transgênicos nos alimentos, e o resultado foi positivo para 23 amostras. Em seguida, foi realizada a quantificação do ingrediente geneticamente modificado nesses produtos. Nove não puderam ser quantificados, pois os teores de ingredientes alterados eram inferiores ao limite de detecção do método utilizado na testagem. De acordo com a Proteste, oito produtos apresentavam mais de 2% de transgênicos em sua composição e deveriam trazer essa informação no rótulo, o que, no entanto, não foi feito pelos fabricantes do biscoito à base de milho Fandangos e dos complementos de cereais Carrefour, Qualitá e Bom Preço. Os demais produtos testados continham menos de 1%.

 

 

 

“Os 23 produtos à base de soja e milho transgênicos encontrados neste teste deveriam trazer a informação em seus rótulos, e não somente os seis que constatamos”, argumenta a Proteste. Para a entidade, todos os fabricantes, independentemente da quantidade de ingredientes transgênicos utilizados, deveriam colocar essa informação à disposição do consumidor.

 

 

 

— É importante que o consumidor possa escolher o que vai comprar, essa informação é um direito dele. Até mesmo as empresas que estão de acordo com a legislação não estão cumprindo o direito do consumidor. E o direito à informação é o ponto alto do Código de Defesa do Consumidor — ressalta Maria Inês Dolci.

 

Embora não existam estudos conclusivos sobre o efeito dos transgênicos no corpo humano, ter o direito de escolher entre um alimento que utiliza ingredientes geneticamente modificados e um que não tem esse tipo de matéria-prima pode fazer diferença no dia a dia, segundo o endocrinologista Rodrigo Siqueira, médico e professor de pós-graduação da Santa Casa do Rio de Janeiro.

 

 

 

— Ter nos rótulos dos produtos essa informação sobre os transgênicos é importante, sim. Ainda não há um grande estudo sobre benefícios ou prejuízos do uso desses alimentos para a saúde humana. No entanto, há relatos de problemas alérgicos relacionados aos transgênicos. Houve o caso de um tipo de milho liberado para consumo animal que provocou alergia em pessoas que se alimentaram com a carne — explica o médico.

 

Os resultados das análises foram encaminhados pela Proteste ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, já que alguns fabricantes não cumpriram a determinação do decreto 4.680. A entidade também enviou o levantamento à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para que esta fiscalize as empresas que não seguem a legislação.

 

 

 

— Não somos contra a modificação genética de alimentos, mas entendemos que os transgênicos devem passar por uma rigorosa e contínua avaliação de risco, garantindo a segurança da saúde humana, animal e ambiental. Além disso, os pedidos de aprovação de novos cultivos devem ser revistos com mais frequência — afirma a coordenadora da Proteste.

 

 

 

Carrefour diz que deixará de vender produtos transgênicos

 

 

 

Em nota, o Carrefour informou que ao longo de 2012 sua linha de itens marca própria será adaptada às diretrizes de qualidade do grupo, “que determina a não utilização de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) na composição de seus produtos.”

 

 

 

A marca Qualitá, do Grupo Pão de Açúcar, informou que “já providenciou a alteração da informação nas embalagens de amido de milho, sendo que esta informação já consta nos novos lotes de produtos”. A empresa destacou ainda que “trabalha de acordo com a legislação e mantém rigoroso padrão de qualidade dos itens comercializados em suas lojas”. Sobre a análise da Proteste, o grupo informou que não iria se manifestar, “pois desconhece a realização do teste, critérios adotados e metodologia”.

 

 

 

Empresas afirmam cumprir exigências da legislação

 

 

 

A Bimbo do Brasil, responsável pelas marcas Pullman e Nutrella, afirmou em comunicado “que atua em consonância com as determinações legais exigidas pela regulamentação brasileira de pesos e medidas em relação à rotulagem de seus produtos”. A empresa também reiterou seu “compromisso em atender cada vez melhor seus consumidores e clientes, com produtos de alta qualidade”. A Bimbo ressaltou que “ainda que não teve acesso ao estudo conduzido pelo Proteste”.

 

 

 

Com relação às análises realizadas nos produtos Neston 3 Cereais, Sollys, barra de cereal Nestlé sabor banana com chocolate e cereais matinais Nescau e Snow Flakes, a Nestlé afirmou em comunicado que “os resultados apresentados demonstram o compromisso da empresa no fiel atendimento da legislação brasileira, em especial o decreto 4.680/2003, que regulamenta a rotulagem de produtos com ingredientes transgênicos. Tal legislação é clara ao estabelecer que tão somente os produtos que contenham ou sejam produzidos com mais de 1% de organismos geneticamente modificados devem ser identificados com o símbolo de transgenia, o que não é o caso de quaisquer dos produtos Nestlé testados.”

 

 

 

Já a BRF Brasil Foods, responsável pelas marcas Sadia e Perdigão, informou que “os resultados da análise realizada pela Proteste atestam que a empresa cumpre rigorosamente a legislação vigente”.

 

As demais empresas citadas no teste não se manifestaram sobre os resultados.

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(*) MAtéria republicada do site Globoonline.