A Caravana Agroecológica e Cultural do Mato Grosso faz parte do processo preparatório do III Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), lembrou Cidinha Moura, representante na Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica pela Rede Cerrado, na mesa nesta manhã (30) sobre a conjuntura nacional e no estado do Mato Grosso. Após as exposições dos debatedores foi aberta a palavra para agricultores, muitos deles assentados, indígenas e extrativistas a fim de discutir os desafios para o avanço da agroecologia na região.
Ultimamente foram realizados seis eventos estaduais sobre agroecologia no Mato Grosso junto aos movimentos sociais do campo. “O ENA será um evento de quatro dias em maio de 2014, em Juazeiro (BA), com oficinas, grupos de trabalho, debate de estratégias de ampliar as experiências agroecológicas em todo o Brasil. Haverá uma feira de saberes e sabores para vendermos nossos produtos e expormos nossas publicações. Nos eventos da ANA a prioridade é a participação de 70% de agricultores, mais os gestores, técnicos, estudantes, e com a previsão de 50% de mulheres em todos os grupos”, destacou.
Cidinha resgatou ainda a realização dos encontros nacionais anteriores, e a promoção do Encontro Nacional de Diálogos e Convergências, realizado em 2011 em Salvador, que agregou diversos setores da sociedade civil ao movimento agroeocológico. Os direitos territoriais dos povos e a saúde com alimentos saudáveis serão dois temas destacados durante o III ENA, buscando dialogar com a sociedade e dar visibilidade às experiências agroecológicas de acordo com a pergunta norteadora do evento: “Por que interessa à sociedade apoiar a agroecologia?”
No dia 17 de outubro foi lançado pela presidenta Dilma em Brasília, durante a 2ª Conferência Nacional de Desenvolvimento Rural, o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica. Faz parte de uma luta histórica dos movimentos agroecológicos e ainda possui muitos desafios apesar dos avanços, afirmou Sara Pimenta, do GT Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA). Segundo ela, o I ENA ocorreu há onze anos pelo reconhecimento de uma agricultura que os camponeses já realizam há décadas.
“Antes do plano tem uma história longa de luta, resistência, conflitos e muito sofrimento. A presidenta lança nessa Conferência, a primeira com paridade de gênero, e numa semana com a votação do PL das sementes terminator e outro para flexibilizar o uso de agrotóxicos. Ocupamos o Ministério da Agricultura e fomos para a Câmara dos Deputados contra a votação desses projetos de lei. Tudo isso ocorre num campo de disputa, temos um modelo hegemônico que precisamos enfrentar. A luta não acabou, até 2015 vamos batalhar para o plano ter mais recursos e abranger mais comunidades, trabalhadores e organizações”, disse.
As mulheres vêm protagonizando no país lutas pela agroecologia e alimentos saudáveis, tanto é que o lançamento de um plano de agroecologia foi uma promessa da presidenta durante a Marcha das Margaridas, observou Sara. Desde então a ANA realizou diversos encontros regionais e um nacional para definir os princípios dessa política em busca de um modelo alternativo de tecnologia, investimentos, compromisso com a função da terra, dentre outras ações para atender a diversidade dos povos do campo e das florestas.
“Cada território tem sua história, cultura, saberes e forma de produzir. Fizemos várias audiências com o governo, e uma moção contra o decreto da política porque não tem como fazer agroecologia sem terra e água. Foi formada uma Comissão Nacional paritária e quatro eixos com subcomissões, além do anúncio do Ecoforte com recursos para apoiar as redes de agroecologia, uma chamada de Ater, e o anúncio de cem decretos de desapropriações”, contextualizou.
Para contextualizar a situação do estado do Mato Grosso nesse cenário, Lucineia Freitas, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), trouxe elementos da mineração, do monocultivo da soja e o uso intensivo do agrotóxico que caracterizam a região. A única coisa democrática hoje no estado, disse a militante, é o câncer provocado pelos agrotóxicos que ataca a todos os ricos e pobres embora seu tratamento seja diferenciado. Ela fez também um resgate histórico da entrada do agroeconegócio no Brasil.
“Desde os anos 2000 é implementada uma série de ações fortalecendo um modelo de desenvolvimento e nós temos que fazer a luta da resistência para não sofrer seus impactos. Fazíamos ocupações, falávamos da monocultura, pistoleiros, mas não existia ainda o termo político agronegócio. O Brasil reprimariza sua produção, ao invés de investir na indústria, e surge o termo bancada ruralista dentro do Congresso. O governo fortalece a produção de matéria prima, investindo na energia com a mineração e na agropecuária, e no Mato Grosso temos os dois em abundância. Há um retrocesso das políticas de reforma agrária e para agricultura familiar, e um avanço sobre as terras indígenas e quilombolas”, criticou.
Na década de 90 o estado tinha muita água, terras extensas para monocultura, muitos minérios em fase de pesquisa, investimento do governo e uma população com gente de todos os estados e desmobilizada e despreparada, complementou Lucineia.
“Se fizermos um mapa temos conflitos em todo estado, foi lançado um mapa da CPT que nos apresenta como a região mais violenta do Brasil. E mesmo que a Dilma faça cem decretos de desapropriação, continua sendo a presidente que menos implementou a reforma agrária no Brasil e a justiça ainda tem que dar parecer. Ninguém garante que tenha no MT, porque o estado tem que ter áreas para o agronegócio. Sofremos com a violência contra os povos indígenas, assassinatos de pessoas que resistem e a impunidade generalizada. E a mídia só repercute mal nossas ações”, concluiu.