Por Laudenice Oliveira (Box por Vaninha Cunha)
Ela veio para o IV Encontro Nacional de Agroecologia (IV ENA) e emocionou as/os participantes da oficina de construção do bandeirão da Comunicação. Ela é Dona Rita Barbosa de Souza, pernambucana, radicada no Rio de Janeiro há 20 anos. Dona Rita veio partilhar conosco do momento onde comunicadoras e comunicadores populares se juntaram para bordar os retalhos das comunicações que têm nas suas práticas locais, as raízes culturais de cada lugar. Teve poesia, teve música, teve emoção. Em todas as falas as denúncias contra quem quer nos calar ou manipular as nossas histórias. E teve os anúncios sobre o que temos de avanço na comunicação popular vivenciada em cada recanto do Brasil.
Mas há história que nos amolece por dentro e no endurece por fora. Que nos causa indignação pela violação de vidas, de aprendizados, de sabedorias. Por isso quero falar de Dona Rita Barbosa, mulher, negra, migrante, forte, de luta e de emoção. Dona Rita é vítima das remoções feitas no Rio de Janeiro para os mega eventos, como o das olimpíadas. Agricultora urbana, ela tinha um quintal produtivo onde cultivava uma grande horta de produtos orgânicos. “Eu tinha lá minha propriedade, era agricultora , plantava uma horta imensa, que todos conhecem, porque isso virou um DVD e saiu nas redes sociais pelo mundo inteiro. E, eu fui removida, enganada pela prefeitura do Rio de Janeiro. Perdi tudo. Hoje eu luto na justiça para ter uma moradia digna. Não gosto muito de lembrar, porque foi muito massacre. Fui eu, foi a minha propriedade, foi a Vila Autódromo, aonde os agricultores, os pobres, os negros, apanharam muito. Foi muita violência. E isso nos marca, porque o Rio de Janeiro não é uma cidade que é feita pra nós, não é feita para pobre, não é feita pra negros”, denuncia Dona Rita muito emocionada.
Cada fala de Dona Rita, era um grito de indignação pela agressão que o Estado promove contra os povos, contra quem já não tem quase nada e deveria ser acolhido pelo poder público. “Há um massacre dentro das comunidades, principalmente quando se trata de agricultores, porque o Plano Diretor do Rio de janeiro é uma porcaria, que diz que o Rio de Janeiro não tem agricultura, não tem agroecologia. E, tem muitos agricultores na região metropolitana”, afirma Dona Rita. Ela fala das agressões que agora sofrem agricultores/as que vivem em Vargem Grande. “Lá no parque, os agricultores que moram lá estão sendo ameaçados de serem despejados. Se o parque existe, é porque ali têm os agricultores que cuidam, não colocam o lixo, plantam por debaixo da floresta, mas estão sendo ameaçados”, diz.
E é assim que o retalho da comunicação popular do Rio de Janeiro está, com as dores, com os sabores das feiras, com as lágrimas e as indignações. Mas com as culturas das feiras, do samba, do funk, com a firmeza das mulheres, com as músicas, os contos e os cantos. “Essa colcha de retalho ela mostra tudo que lutamos, é uma luta imensa. Então, tudo tá aqui retratado”, finaliza Dona Rita.
E é assim que se costura, que se constroi a bandeira da comunicação popular vivenciada, praticada dentro do Movimento Agroecológico. Nela, cada ponto dado é um ponto contado e cantado, até em poesia. “Eu te acompanho, que bordar sozinho nestes tempos causa danos. Ponto à frente, ponto com volta, ponto e vírgula. Aquele que se esconde e se enrosca, e talvez, também, o que se mostra. Porém, ao ponto final, aponta o corpo inteiro. Irmã, eu só posso e só desejo bordar um ponto que sirva um pouco a este solo”. Esta poesia é uma tradução livre do poema Bordado de Laura Devetach. Continuemos, então, bordando a nossa história da comunicação popular no Brasil.
Bandeirão de Luta – “Sem afeto não há agroecologia”. Esse foi o grito escoado pelas vozes de representantes dos diferentes estados do Brasil, que participaram da oficina para a junção das Bandeiras de Lutas de Comunicação e Cultura, assim como Dona Rita Barbosa. Com pinturas, bordados, desenhos e costuras, os participantes imprimiram suas essências, características e identidades agroecológicas, saberes e fazeres dos povos na comunicação e cultura popular. A atividade fez parte do IV Encontro Nacional de Agroecologia (IV ENA). De acordo com, Patrícia Tavares, do Grupo de Trabalho de Cultura e Comunicação, da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), o objetivo dessa construção foi mobilizar e articular as experiências agroecológicas a partir do diálogo da cultura e da comunicação. “Nossa proposta foi pensar algo que conseguisse expressar essas experiências e o que a cultura e a comunicação representam para essas experiências, nos seus territórios, através de uma expressão mais artística, mais simbólica e que pudessem ser retratadas em pequenos retalhos”, explica.
Edição: Luciana Rios