São Luís (MA) – Iniciou na manhã desta terça-feira (07/04/15) o Seminário Regional da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) na Amazônia e Construção da II Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo). O encontro vai até a próxima quinta-feira (09) em São Luís, no Maranhão, e tem como objetivo aprofundar o debate sobre a incidência das políticas públicas de promoção da agroecologia na região. Os cerca de 30 participantes vão avaliar o I PLANAPO e construir propostas para o II PLANAPO, que terá vigência de 2016 a 2019. No último dia do encontro será discutido o planejamento das ações da ANA na região.
De acordo com Fabio Pacheco, da ONG Tijupá e representante da ANA Amazônia, o fundamental é deixar claro quais são as prioridades das organizações. É uma oportunidade de debater uma política de agroecologia para região e subsidiar a negociação com o governo. “Nem tudo está garantido de sair daqui para o PPA (Plano Plurianual). Mas mais importante ainda é ter um plano para ANA e lutar por políticas adequadas ao movimento agroecológico. Um plano que tenha um enfoque territorial, as nossas visões do que é agroecologia na Amazônia”, afirmou.
“Nosso desafio está de acordo com a carta Por um Brasil Agroeocológico, feita pela Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO), que mostra como o pensar da agroecologia está contagiando o país. Não está mais só no campo da produção, mas também da população urbana preocupada com o que consome nas cidades. Precisamos dar a cara da Amazônia para somar nessas questões”, complementou Eduardo Borges, da ONG Pesacre, também coordenador do seminário.
A mesa de abertura do evento debateu “Amazônia: Populações Tradicionais, Extrativismos e Agroecologia”. De acordo com Tatiana Sá, representante da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) no norte do país, é preciso levar em consideração algumas diferenciações da Amazônia em relação às outras regiões para pensar em políticas públicas: diversidade étnica, cultural, presença massiva de floresta primária e secundária, volume de água, etc. Segundo ela, a ANA e a ABA cumprem um papel importante no processo de circulação e acordos para mercados alternativos que rompem com os dominantes e ajudam na sustentabilidade, além do fortalecimento político e da dimensão sócio cultural.
“Toda essa diversidade está ligada, e precisa contemplar os planos futuros de alimentação. A região é composta por agroflorestas variando suas áreas de utilização, grupos ocupantes, etc, na convivência do extrativismo com a agricultura familiar. A Amazônia tem sofrido mudanças sociais e ambientais bastante fortes em muito pouco tempo: construção de grandes rodovias e hidroelétricas, fortes impactos com extração da madeira, gado, soja, dendê, mineração, etc. Situações contrastantes das reservas e outras comunidades tradicionais. É preciso entender essas implicações para pensar nas dimensões da agroecologia a partir dos instrumentos atuais. E a presença de extrativismo do Planapo está distante da realidade, é preciso fazer uma revisão, detectar sua efetividade e apontar o que não foi abordado”, concluiu.
Essa diversidade de povos e comunidades tradicionais tem todo um processo de ocupação, que criou formas seguras de sistemas de produção, relações com os territórios e modo de vidas, complementou Paulo Gonçalves, da APA-TO. Ele deu como exemplo as comunidades ribeirinhas e quilombolas que já têm seus processos de gestão de acordo com a natureza, frutas nativas e animais locais. A prioridade, em sua opinião, é garantir no próximo Planapo a retomada do eixo terra território proposto pela ANA.
“Eles desenvolveram processos de gestão territorial a partir de uma prática de vida e compreensão ecológica. Essas lógicas estão lá guardadas e muitas vezes não enxergamos. A partir dela são feitos ajustes, tudo está em processo de transição. Existe uma ameaça profunda sobre essa agroecologia, com assalto aos territórios. No governo está ausente a reforma agrária e a regularização fundiária dos povos e comunidades tradicionais. Há um avanço do agronegócio com a monocultura, e essa expansão vai exterminando a biodiversidade e encurralando as populações. É preciso também ter uma Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) com outra concepção, pois a atual condiciona as famílias à agropecuária. Não é focada nos sistemas de produção tradicionais, vêm com pacotes externos padronizados”, criticou.
Representando o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) na região, Manoel Edivaldo Matos disse que em sua região está em curso um projeto com 140 comunidades, em torno de 250 mil hectares, cujos territórios desde 2005 não foram regularizados. Ele também está preocupado com o avanço do agronegócio sobre os assentamentos, comunidades indígenas e quilombolas, reservas, dentre outras, na região de Santarém, no oeste do Pará. “Estão avançando com a soja beirando a transamazônica e BR 163. Em Santarém tem 6 projetos agroextrativistas, a maioria deles em área de várzea. Tem 11 territórios quilombolas, mas apenas 3 estão na etapa de titulação. O Cadastro Ambiental Rural (CAR) é a porta de entrada para regularização fundiária, defendemos editais com propostas locais a partir da experiência do Sindicato, controle e elaboração do CAR. Participação na construção de propostas. Empoderar as comunidades para cobrar os governos, precisamos criar um plano e instrumentos específicos para contemplar cada segmento: uma política de desenvolvimento para dar condições às famílias ficarem em seus territórios”, sugeriu.
“Ainda não temos maneiras na legislação de resguardar o território como deveria, porque tem elementos que está mais voltada para proteger a natureza ou para o patrimônio imaterial. Na Bolívia, por exemplo, tem uma legislação que resguarda o território, seus cultivos e diversidades. Existe uma proteção para as pessoas resguardarem juridicamente seus direitos. Além de não termos isso, está se fragilizando cada vez mais como, por exemplo, no caso do PL 7735 da Biodiversidade. Será a mercantilização oficial dos recursos naturais e seu conhecimento associado. Temos que demandar um modelo que se adeque não só ao território, mas também aos conhecimentos tradicionais”, reforçou Fabio Pacheco.
O seminário regional é o primeiro dos cinco previstos no Projeto Promovendo Agroecologia em Rede da ANA junto à Fundação Banco do Brasil. Serão realizadas ainda até o final de 2015 caravanas agroecológicas, estudos de experiências territoriais, um seminário nacional, dentre outras iniciativas no campo da comunicação.