Documento assinado por entidades de diversos países contextualiza o cenário global 20 anos depois da Cúpula da Terra (ECO 92), realizada no Rio de Janeiro. A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), prevista para junho no Rio de Janeiro, pode vir a ser para estas organizações um espaço de debate de cúpula sem grandes avanços ambientais e sociais. Por isso, é preciso aproveitar o momento para agir e criar mecanismos concretos para reverter a situação: “Que opções temos, quando mais do mesmo não é uma opção?”, questiona o documento “Tempo de Agir!”
A questão da agricultura é um problema central nos dias de hoje. Apesar de o agronegócio ser o modelo de desenvolvimento hegemônico, existem sistemas alimentares viáveis e sustentáveis crescendo por todo o mundo. Os produtores agrícolas de pequena escala atualmente fornecem alimentos para cerca de 70% da população mundial. O fortalecimento da agricultura familiar é, dentre outras questões abordadas, uma das alternativas apresentadas.
Os sistemas alimentares industriais, por sua vez, estão contribuindo substancialmente para a insustentabilidade da produção de comida. Comprometem o plantio de alimentos saudáveis, devido à vasta utilização de venenos e outras substâncias químicas, provocam danos ambientais relevantes, como a perda de fertilidade do solo. Além do problema de saúde em grande escala, os sistemas agroindustriais empobrecem milhões de agricultores, que migram para as cidades. A insegurança alimentar é outro resultado. Mas as formas tradicionais de agricultura dos camponeses, praticadas há séculos, vêm sendo potencializadas. A agroecologia vem florescendo há algumas décadas como solução para o campo e a fome, reduz o aquecimento global, e restaura a biodiversidade, dentre outros benefícios.
Com uma crise energética, financeira e ambiental mais profunda no planeta, continuar pelos caminhos do crescimento econômico percorridos nos últimos anos só aumentará o cenário de degradação socioambiental. Florestas estão desaparecendo, fontes de águas sendo poluídas e a biodiversidade devastada. A questão climática, em paralelo aos embates de fontes energéticas, precisa de uma solução mais racional. Mantendo os padrões de consumo, costumes e valores atuais, o modelo de vida contemporâneo inevitavelmente chegará a limites insustentáveis. O próprio Relatório Econômico e Social Mundial 2011 revela uma grave situação.
O progresso econômico, por exemplo, não pode seguir adiante à custa das populações dos países em desenvolvimento. As pessoas precisam de uma vida decente, especialmente os bilhões que ainda vivem em condições de extrema pobreza. O povo está descrente nas autoridades, após diversas reuniões internacionais que não passaram de cartas de intenções. A maioria das promessas não foram cumpridas, por causa dos interesses econômicos, sobretudo das empresas multinacionais.
Por isso, o documento ressalta a oportunidade histórica da conferência Rio+20. É preciso tomar decisões importantes e definir ações concretas que realmente ajudem a erradicar a pobreza e a fome, além de salvar o meio ambiente. É tempo de agir, afirmam as organizações da sociedade civil. Nesse sentido, são apontadas 15 premissas que devem ser levadas em conta na reunião de cúpula. A principal delas é que a agricultura em todas as suas dimensões seja um tema central dos debates e políticas públicas decorrentes. O apoio e fortalecimento dos sistemas agroecológicos de produção, assim como outros modelos de pequena escala sustentáveis, são prioritários. Apoiar a adoção de uma Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos Camponeses reforça essa perspectiva.
A busca por um modelo mais generoso e sustentável para a humanidade norteia as 20 propostas do documento, que defende a restauração do apoio público à agricultura para enfrentar a crise alimentar. O direito à terra aos camponeses também é fundamental, assim como a conversão dos territórios sujeitos à grilagem ou à produção de agrocombustíveis em áreas produtoras de alimentos. Garantir uma alimentação suficiente, nutritiva e adequada para pelo menos 9 bilhões de pessoas até 2050 é uma meta, que pode ser facilitada com a reestruturação das prioridades das pesquisas para apoiar os cultivos camponeses. A redução do desperdício, seja nas colheitas, processamento ou distribuição de alimentos, incluindo o bom manejo da água, pode contribuir nessa direção. A diversificação dos alimentos, fortalecendo redes alimentares ao invés da cadeia alimentar em vigor, controlada pelo oligopólio de 8 empresas, poderia influenciar na redução do preço em até 30%. Tudo isso só pode ser realizado com a autonomia das sementes, e o fortalecimento dos direitos das mulheres produtoras de alimentos, além do fortalecimento dos sistemas alimentares urbanos e periurbanos.