FAMILIAS AGRICULTORAS E DIVERSIDADE DE ALIMENTOSPor Josi Basso,

Trata-se do prêmio promovido pela Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social, que na edição 2013 elegeu o
projeto ‘Agrofloresta baseada na estrutura, dinâmica e biodiversidade florestal’ um dos três melhores do Brasil, na categoria “Comunidades Tradicionais, Agricultores Familiares e Assentados da Reforma Agrária”. A edição deste ano teve 1.011 inscritos e, ao final, cinco categorias definidas, com 15 projetos premiados.

A Cooperafloresta – Associação que atua com 120 famílias agricultoras e quilombolas desde 2003 visando à adoção dos Sistemas Agroflorestais (SAFs) – prática que promove a proteção e recuperação ambiental aliada ao resgate da dignidade de vida dos seus associados – está entre os 15 projetos eleitos os melhores do país, pela Fundação Banco do Brasil (FBB) de Tecnologia Social, que atuam na transformação de comunidades.

Ao todo, foram 1.011 inscrições, o que resultou na definição de cinco categorias, sendo três contemplados em cada uma delas. Os projetos passaram a compor o Banco de Tecnologias Sociais da FBB em um cadastro online que dispõe as soluções desenvolvidas e aplicadas por instituições para os mais diversos problemas sociais.

A Associação dos Agricultores Agroflorestais de Barra do Turvo/SP e Adrianópolis/PR (Cooperafloresta) ficou em segundo lugar na “Comunidades Tradicionais, Agricultores Familiares e Assentados da Reforma Agrária”. O prêmio nesta categoria foi decorrente do desenvolvimento da tecnologia social ‘Agrofloresta baseada na estrutura, dinâmica e biodiversidade florestal’. As vencedoras foram escolhidas segundo critérios de inovação, interação com a comunidade, poder de transformação social e potencial de reaplicabilidade.

‘Agrofloresta baseada na estrutura, dinâmica e biodiversidade florestal’

O conceito da Tecnologia Social desenvolvida pela Cooperafloresta é o de aliar o desenvolvimento econômico e social com a integração entre homem e natureza. Em Barra do Turvo (SP), no Vale do Ribeira – região com um dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Estado – onde, em 2003, a Associação iniciou a implantação desta Tecnologia, a população não tinha conhecimento sobre técnicas de manejo e prevalecia a monocultura, com exploração predatória dos recursos naturais da Mata Atlântica, bioma da região.

No sistema convencional, de monocultivo, o solo geralmente chega a um ponto em que fica completamente degradado e sem nutrientes para produzir e manter as reservas naturais. Ao acompanhar a dilapidação do patrimônio genético da floresta, aliada à ausência de uma política voltada ao manejo sustentável, com famílias abandoando suas terras, sem destino, saúde e trabalho, iniciou-se estudo e implantação da Agrofloresta na região.

Com a Agrofloresta, o material vegetal pré-existente é cortado e disposto de forma ordenada e com arranjo definido no solo, sem a utilização de fogo. Ao longo do tempo, há um manejo intensivo da vegetação, especialmente na poda e na disposição do material podado no solo, criando o que se chama de ‘berços’. Desta maneira, o aproveitamento da matéria orgânica pela vida do solo é ainda maior que nas clareiras naturais. A água entra melhor na terra, com maior aproveitamento. É nesta pequena faixa que se colocam as sementes, tubérculos ou manivas. Ao longo do tempo, vão surgindo várias espécies de plantas por regeneração natural.

Na agricultura convencional, essas espécies seriam eliminadas. Em uma agrofloresta, procura-se manter, a cada etapa de sucessão, espécies adequadas às situações de fertilidade do solo, conjunto de espécies companheiras ao redor e luminosidade nos diferentes andares. O resultado é a integração entre homem e natureza. “Consideramos ser essa a agricultura ideal para o planeta, pois a convencional está destruindo e desrespeitando o meio ambiente. A nossa técnica trabalha a relação homem e natureza, pois os cultivos em equilíbrio não se exaurem, mas colaboram entre si, mutuamente”, enfatiza Lucilene Vanessa Andrade, agrônoma que integra a equipe técnica da Cooperafloresta.
Com isso, na agrofloresta você está plantando e colhendo ao mesmo tempo e regularmente gerando renda. O adubo vem da própria natureza; as podas feitas corretamente deixam os raios de sol entrar e dão força para as verduras, legumes, hortaliças, frutas crescerem. E o mais importante: tudo vai para as próprias famílias por meio da comercialização coletiva.

“Vale ressaltar que as agroflorestas, conduzidas sob uma lógica agroecológica, transcendem qualquer modelo pronto e incorporam a sustentabilidade quando se desenham agroecossistemas adaptados ao potencial natural do lugar, aproveitando os conhecimentos locais. Assim sendo, não existe um modelo, e sim, princípios, fundamentos e práticas que têm que ser adaptados a cada realidade”, finaliza a engenheira agrônoma Lucilene Vanessa.

Resgate do conhecimento tradicional

“Buscamos articular o resgate do conhecimento tradicional, a geração de pesquisas de forma participante à difusão dos ensinamentos técnicos para, com isso, termos como resultado a geração de renda por meio da produção nas agroflorestas. Mas, aliado a isso, resgatamos, em cada cultura presente na Mata Atlântica, o valor pessoal para o enfrentamento da exclusão social”, enfatiza o engenheiro agrônomo e técnico da Cooperafloresta, Nelson Eduardo Corrêa Netto.

Um exemplo,cita Corrêa Netto, são os Quilombolas, que têm seus conhecimentos tradicionais, fundamentais para o desenvolvimento daquele solo em questão e das suas culturas ancestrais. Para tanto, os processos de organização das famílias, valorização dos seus sabores são fundamentais para o sucesso das Agroflorestas.

Sucesso da Agrofloresta é fruto de um processo continuado

“Diante da situação em que se encontravam as famílias agricultoras e quilombolas do Vale do Ribeira, de exclusão resultante de um modelo agrícola concentrador e gerador de graves impactos econômicos, sociais e ambientais, com poucas perspectivas de superação, a adoção do modelo agroflorestal foi essencial para o resgate das 120 famílias associadas”, lembra Nelson.

O sucesso do projeto, que proporciona, continuamente, ampliação significativa de renda para as famílias associadas; diversidade de produtos para autoconsumo e recuperação de 1 mil hectares (ha) dos recursos naturais demonstram o sucesso dos sistemas agroflorestais desenvolvidos pela Cooperafloresta. Para tanto, o processo continuado de organização, formação e assessoria técnica para o desenvolvimento das agroflorestas, certificação participativa e comercialização coletiva é de fundamental importância.

“Estamos em constantes estudos, prestando assessoria técnica, colaborando com o desenvolvimento do processo como um todo. A sistematização das experiências oportuniza um olhar qualificado para a tecnologia social, gerando referenciais para serem socializados na perspectiva da sua multiplicação. Para tal, estabelecemos parcerias com institutos de pesquisa e universidades, que têm realizado estudos e pesquisas regulares”, enfatiza o técnico da Cooperafloresta.

Prática agroflorestal também fortalece assentamentos de Reforma Agrária

Famílias agricultoras de assentamentos de Reforma Agrária, em diversos municípios do Brasil, também estão sendo beneficiadas pela adoção dos Sistemas Agroflorestais (SAFs) com apoio da Cooperafloresta.
Atualmente, cerca de 180 famílias agriculturas assentadas, distribuídas nos municípios de Morretes, Antonina, Paranaguá, Serra Negra (Litoral do Paraná), Lapa (grande Curitiba/PR), Ribeirão Preto e Apiaí (ambos em São Paulo) estão tornando seus lotes em um modelo viável de produção alternativa à monocultura e um exemplo de reforma agrária bem-sucedida.

Cada localidade com suas peculiaridades climáticas e socioeconômicas estão se integrando em torno de um só objetivo: proteção e recuperação ambiental aliadas ao resgate da dignidade de vida das famílias. “Para tanto, o trabalho é detalhado, moroso, mas satisfatório”, diz Nelson Corrêia Netto.
“Apesar dos assentados já terem conhecimento sobre o respeito ao meio ambiente em razão do engajamento na causa da Reforma Agrária, na maioria dos lotes, a exemplo dos de Ribeirão Preto, as terras estão desgastadas pelo uso de agrotóxicos, heranças deixadas pelo cultivo da cana de açúcar”, finaliza o engenheiro agrônomo Nelson Eduardo Corrêa Netto.

“Hoje pra mim não tem outra forma de agricultura que não seja no sistema agroflorestal, onde tem vida, fartura, diversidade, renda e ainda contribuímos com meio ambiente”, ressalta Ademir Fernandes, do Assentamento Pantanal, membro do Grupo Agroflorestal Gralha Azul /MST em Morretes, litoral do Paraná.

(*) Fonte: Cooperafloresta.