Por Eduardo Sá, da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) / Mídia Ninja
Desde 2014, a prefeitura de São Mateus do Sul, no Paraná, vem implementando um projeto municipal de agroecologia com diversas ações para atender à agricultura familiar local. Dentre as muitas experiências em curso na cidade, encontram-se uma feira agroecológica, um vale para aquisição de produto da agricultura familiar, ações de fortalecimento da assistência técnica rural (Ater) e de políticas públicas, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Essa é mais uma iniciativa identificada pelo Agroecologia nos Municípios, realizada pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).
Tudo começou por volta de 1993, quando um pequeno grupo de agricultoras/es buscou alternativas à crise do plantio da agricultura convencional com a utilização de produtos químicos. Muitos estavam perdendo suas sementes e os insumos eram caros, gerando muita dependência financeira, dentre outros desafios. Com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Mateus do Sul – FETAEPl, da ONG AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia e da Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) foi criado o Grupo Alimentos para a Vida, uma Feira Livre Municipal e outra de trocas de sementes, além de uma série de atividades potencializando a agricultura familiar local. Nesse processo, em 2004, foi fundada a Cooperativa de Famílias de Agricultores Ecológicos de São Mateus do Sul (Cofaeco), que possibilitou diversas ações de comercialização de alimentos e acesso a políticas públicas.
O projeto São Mateus do Sul Agroecológico (n° 326/2021 – convênio entre prefeitura e universidade) nasce em parceria com o Laboratório de Mecanização Agrícola da Universidade Estadual de Ponta Grossa(Lama/UEPG), por meio do projeto Entre Rios, na época financiado pela Petrobras e hoje pelo município, voltado para o desenvolvimento rural sustentável. Hoje, prevê R$ 160 mil para dois anos de projeto viabilizando a contratação de um técnico e a construção de dez unidades de referência (muda, agroindústria, agroecologia, etc), cada uma no valor de R$ 5 mil, além de um recurso destinado à comunicação. É um projeto de assistência técnica e extensão rural que visa atender 50 famílias de agricultores orgânicos no município. A certificação orgânica e a adequação ambiental de propriedades familiares eram os principais focos executados, mas atualmente os objetivos estão mais voltados para a Ater: produção e agroindústria, implementação de unidades, certificação orgânica, apoio à comercialização e conscientização de consumidores, políticas públicas voltadas à agroecologia, fortalecimento de cooperativas e associações e articulação de uma rede regional de apoio à agroecologia.
Atualmente, muitos movimentos e organizações sociais estão envolvidas com as ações de agroecologia no município, após uma série de reuniões, debates e encontros entre grupos de agricultores (as) e o poder público. O projeto Vale-Feira – Real-Mate (Lei n° 023/2021), que oferece um cupom no valor de R$ 50,00 por pessoa para a aquisição de alimentos agroecológicos, é fruto dessa articulação junto ao Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PR), que em suas reuniões apresentou essa proposta para atender às famílias em vulnerabilidade social. A ação busca atender, mensalmente, 100 famílias cadastradas (hoje são 35 famílias cadastradas) no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) para trocarem o vale por alimentos saudáveis na Feira do Produtor Municipal. Além de gerar renda para as/os agricultoras/es, os consumidores também são beneficiados com o valor do cupom para gastar na feira.
De acordo com o secretário de agricultura da cidade, Osni B. Staniszewski, há uma preocupação da prefeitura em promover a alimentação saudável e a sustentabilidade. Nesse sentido, alguns projetos estão em curso potencializando a agroecologia na cidade e outros estão em processo de licitação, como a aquisição de máquinas, equipamentos agrícolas e um automóvel. O município já foi contemplado com recursos para adquirir outros equipamentos, veículos e implementos agrícolas, além de estarem em curso diversas outras tratativas com órgãos das esferas estadual e federal, complementou o secretário.
Além do vale feira, existe também o programa Caminhos do Campo (Lei Municipal nº 3009/2021), que ajuda agricultores familiares com máquinas, material e suporte para a construção e manutenção de vias de acesso às propriedades. O financiamento é de 50% do valor de serviço a ser realizado e tem como referência a tabela SINAPI. Desde o início, segundo a prefeitura, foram atendidas cerca de 300 famílias e os pedidos de adesão à iniciativa vêm aumentando. Também está em curso a execução do antigo PAA (cerca de R$ 208 mil), hoje Programa Alimenta Brasil (PAB), via Ministério da Cidadania e do Pnae, cujo repasse do governo federal para este ano gira em torno de R$ 547 mil beneficiando quase 40 famílias para atender os alunos da rede municipal. Segundo técnicos que prestam assessoria local, o valor do PAB é insuficiente para atender todas as entidades e muito baixo para o agricultor, além de faltar diversidade de produtos e o preço do alimento ser defasado.
“Nossa intenção é o fortalecimento dos pequenos agricultores. Hoje, temos cerca de 53 produtores rurais certificados e estamos fazendo convênios para ampliar esse número. A perspectiva é formalizar essas famílias para ampliar os projetos e potencializar as ações em curso. Algumas coisas estão em processo de licitação, estamos correndo atrás de mais verbas e a COFAECO conseguiu recentemente, graças ao Programa Coopera, do estado do Paraná, o primeiro caminhão refrigerado. Já estamos colhendo frutos de ações implementadas pela nossa gestão com o objetivo de ampliar ainda mais as condições propícias ao bom andamento das atividades realizadas no município, através da formalização de grupos formados por agricultoras/es”, afirmou o secretário.
De acordo com alguns (as) agricultores (as) e assessores (as) técnicos (as), apesar de todos esses avanços, alguns desafios como as burocracias e o convencimento a agricultores (as) fazerem a transição para a produção agroecológica ainda estão presentes. Seja com a complexidade de articular as famílias em torno dos projetos, ou de operacionalizar as ações do programa, que exige diversas documentações e procedimentos para garantir os pagamentos. Dessa forma, muitos projetos acabam sendo temporariamente suspensos ou ficam pela metade.
A agricultora familiar Rosana Magalhães e seu marido Sebastião de Meira, juntos ao seu filho Mateus Magalhães, da comunidade Terra Vermelha, são certificados pela Rede Ecovida de Agroecologia e possuem uma agroindústria que processa, principalmente, doces e molho de tomate. Produzem leite e hortaliças também e o beneficiamento dos seus produtos se tornou Unidade de Referência no Projeto São Mateus do Sul Agroecológico. “Para nossa família, o projeto veio somar, principalmente na questão da agroindústria, pelo motivo da diversificação dos alimentos na propriedade e na agregação de valor em produtos in natura. Assim como no planejamento das ações a serem desenvolvidas e na busca por novos mercados, como a compra coletiva que irá iniciar no município. A partir do projeto também realizei oficina de panificados e boas práticas, onde consegui trocar experiência com outras agricultoras”, destacou Rosana.
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