juventudePor Janaina Ferraz (assessora para a Juventude do Centro Sabiá)

Entre os dias 23 e 25 deste mês, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) realizou, em Brasília-DF, a Oficina de Diálogos sobre o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural. Em linhas gerais, a oficina se deu a partir do debate que deu surgimento ao Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural. O MDA coordena a construção do plano que deve ser lançado ainda este ano. Os trabalhos vêm sendo realizados em conjunto com o Comitê de Juventude do Condraf (Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável) que já vem levantando esse debate, a partir de um conjunto de atividades realizadas que trouxeram elementos importantes sobre a temática. Além das propostas que foram construídas anteriormente nos processos de conferências das juventudes em seus diversos níveis.

As mesas de debates trouxeram elementos importantes sobre estudos e reflexões que têm envolvido às juventudes, termos que historicamente são perpetuados como “o campo é atrasado”, ganham força no debate para sua desconstrução. Questões como a invisibilidade das juventudes, sua autonomia produtiva e econômica junto às famílias, também entraram em discussão. A manutenção dos aspectos relativos ao machismo e ao patriarcado foram elementos de reflexão, assim como a grandiosa diversidade que há nas juventudes camponesas. Questões sobre geração, gênero, raça, etnia e orientação sexual entraram na pauta.

A oficina trouxe à baila outras pautas apontadas pelos movimentos sociais como a ausência de políticas estruturantes para as juventudes do campo, das águas e das florestas. A falta de acesso à terra, ao crédito, assim como a burocratização da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), já que é ela que permite o acesso a programas de políticas públicas. A ausência de direitos básicos para essa população como educação contextualizada do e no campo, ausência de espaços físicos e ações concretas de cultura e lazer, foi colocada na roda de debates. São muitas questões colocadas e refletidas para dizer que as juventudes precisam de fato ser vistas como sujeitos de direitos.

O campo que queremos – foi a mesa dos movimentos sociais que contou com a representação da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), com a Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), com a Pastoral da Juventude Rural (PJR) e a Comissão Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais. O intuito foi de refletir e trazer a público os grandes desafios para a estruturação de fato do Plano. Dentre os entraves, está a preocupação com o orçamento para efetivação do mesmo. A garantia da Reforma Agrária e ao crédito fundiário é estratégico para as juventudes do campo. A defesa é que o Plano seja executável.

A mesa dos movimentos sociais defendeu que o documento final estruture propostas que tratem da afirmação da identidade desses sujeitos de direitos. Dentre as várias questões colocadas, uma deixa um desafio grandioso: o de como materializar a agroecologia como um modelo de desenvolvimento rural sustentável e como fazê-lo chegar aos territórios, municípios e Estados brasileiros, já que muitas das propostas de ações são de responsabilidade dos municípios e/ou estados.

Uma carta dos movimentos das juventudes do Campo, das Florestas e das Águas foi lançada no final da Oficina de Diálogos sobre o Plano Nacional de Juventudes e Sucessão Rural, promovida pelo Governo Federal.

Eis a carta:

CARTA DOS MOVIMENTOS DE JUVENTUDES DO CAMPO, DAS FLORESTAS E DAS ÁGUAS

Nós, movimentos sociais de juventudes do campo, das florestas e das águas presentes na Oficina de Diálogos do Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural, realizada em Brasília entre os dias 23 e 25 de fevereiro de 2016, ressaltamos a importância da estruturação deste plano para o conjunto da sociedade brasileira. Entendemos que ele é resultado da luta histórica dos movimentos sociais em favor do direito das juventudes construírem seus projetos de vida nos territórios rurais com qualidade de vida. Assim, é fundamental que ele assuma como princípio o reconhecimento das juventudes como sujeitos políticos e de direitos, estratégicos para consolidar o campo que queremos.

Dessa forma, a implementação do Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural deve encarar os grandes dilemas que se perpetuam nos territórios rurais e afetam, de forma diferenciada, as juventudes. Portanto, ele deve:

• Romper com a matriz produtiva que se baseia na exploração de terras e bens naturais comuns, reconhecendo a agroecologia como matriz tecnológica e modo de vida garantidor de soberania alimentar e vida digna no campo e na cidade. Assim, propomos que a agroecologia seja um eixo específico dentro do Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural.

• Combater o modelo fundiário vigente, concentrador de terras e riquezas, garantindo a implementação da reforma agrária e demarcação dos territórios indígenas, quilombolas e demais povos e comunidades tradicionais, como instrumentos de justiça e inclusão social.

• Romper com o sistema educacional que historicamente privilegia os interesses das classes dominantes, que vem servindo à lógica do mercado, expresso pela ofensiva das elites e das estruturas do estado brasileiro, diante do fechamento de milhares de escolas do campo e das políticas de profissionalização comprometidas com a formação de mão de obra barata. Diante disso, afirmamos os princípios da educação do campo como pilares orientadores para emancipação e empoderamento dos sujeitos do campo, das florestas e das águas, sendo fundamental o investimento em experiências populares da pedagogia da alternância.

• Combater as relações de discriminação e desigualdades no que se refere às questões de gênero, diversidades sexual, raça, etnia, geração e diversidade religiosa, sobretudo, na atual conjuntura onde avança o conservadorismo na sociedade brasileira.

• Superar a lógica capitalista orientada pela economia de mercado, baseada no lucro, na exploração e na mais-valia, que intensifica a desigualdade social. Temos como referência a promoção da economia solidária e fortalecimento do cooperativismo e associativismo nos territórios rurais.

• Romper com a imagem do rural como espaço de atraso. Afirmamos o meio rural como território de direitos, onde as populações do campo, das florestas e águas devem ter asseguradas políticas públicas, serviços e infraestrutura coerentes com sua diversidade de identidades. Assim, saúde, esporte, lazer, cultura, comunicação e informação, habitação, Assistência Técnica e Extensão Rural, segurança pública são alguns dos direitos fundamentais para a vida destes territórios.

• Não aceitamos as repetidas tentativas de retroceder na democracia, diante disso, precisamos avançar e aperfeiçoar as estratégias de organização social, diálogo, participação, decisão e espaços de controle social, garantindo a democracia plena.

• Não admitimos pagar pela crise econômica e política. As medidas empreendidas pelo governo federal tem atacado diretamente a classe trabalhadora, reduzindo direitos conquistados pelas lutas populares. Combateremos qualquer retrocesso, sobretudo, diante dos cortes que atacam áreas estratégicas para as populações do campo, das florestas e das águas, bem como frente às propostas de reforma previdenciária que estão em debate.

Entendemos estes como pontos estratégicos para a estruturação de um Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural que promova efetivamente oportunidades para os/as jovens do campo, das florestas e das águas construírem com autonomia suas trajetórias nos territórios rurais. Para tanto, é fundamental que o conjunto dos ministérios afirmem seu compromisso com as juventudes, construindo esforços no sentido de estruturar políticas coerentes com as demandas juvenis do campo e aportando recursos que concretizem tais ações.

Brasília, 25 de fevereiro de 2016.