dsc02399por Alan Tygel. Fotos: Winnie Lo

Melhorar as técnicas tradicionais e trazer inovações para garantir a renda, a segurança alimentar e preservação da floresta. É assim que as 3 gerações da família Moraes vêm aprimorando a produção alimentos dentro Amazônia, para o próprio consumo e venda no mercado.

Miracélia e Dulcimar Moraes, conhecido como Seu Dudu, vivem na comunidade Boa Esperança, à beira do Rio Pagão, que fica em Curralinho, um dos 16 municípios dentro do Arquipélago do Marajó, no Pará. Dos nove filhos, 8 nasceram lá mesmo, com ajuda de parteiras tradicionais, assim como a maioria dos netos. Mesmo morando num local com um dos piores IDHs do Brasil, Seu Dudu não tem dúvidas sobre sua qualidade de vida: “Aqui é um dos grandes paraísos desse planeta.”

dsc02243Para os moradores da região, o açaí não é apenas o fruto de uma palmeira qualquer. Além de ser a base da dieta local – não há refeição sem açaí – a extração do fruto garante renda para todas as famílias do local. 

Edel Moraes, uma das filhas do casal, explica a importância do manejo: “No caso do açaí, manejar aumenta a produção. Sem o manejo não tinha a quantidade que tem hoje. O município passou por um processo de extração de palmito muito forte. Pergunte hoje para o produtor se ele quer tirar o palmito ou ver a palmeira em pé dando açaí todo ano?”

O trabalho no açaí envolve toda a família. Desde o manejo, que envolve o corte de árvores onde não é possível subir, e o plantio de outras onde é possível, passando pela a debulha (retirada dos frutos do cacho e seleção) até o embarque das rasas (cestos feitos urumã, outra palmeira) nos barcos que vão até a vila de Curralinho, e de lá para o mundo. Os cocos não selecionados são deixados no local e enriquecem a terra, gerando o chamado “estrume de açaí”.

dsc02277Mas não é só de açaí que vive a família Moraes. “A gente sempre ouve dos mais velhos que antigamente o rio era mais farto. Então, para ajudar, estamos fazendo a criação dos peixes. Criamos o tambaqui, que não é do Marajó, mas é da Amazônia, portanto adaptado para essa região. Queremos ter uma alternativa a mais de geração de renda, mas o principal é garantir a barriga. Tendo peixe e tendo açaí, não falta mais nada. O peixe pode garantir a entressafra do açaí, entre janeiro e junho.”, explica Edel.  

O tanque é feito com o mínimo de impacto, respeitando da melhor maneira o curso original dos igarapés. Uma válvula controla a comunicação entre o Rio Pagão e o tanque, permitindo a circulação das águas de modo que o peixe não tenha “gosto de lama”, como ocorre com a produção em cativeiro tradicional. 

Edel conta como é feito o consórcio: “Só na beira do poço você pode ver o açaí, ingazeiro, andirobeira, taperabá, virola, cuuba, bananeiras, caueiro, muruci, jambo, mangueira, tudo isso tá aqui junto e vai sendo manejado. Mas próximo da casa predomina o açaí, mas não quer dizer que seja só açaí. Inclusive, para conhecimento da comunidade, já se sabe que se plantar só açaí perde a qualidade, tanto da produção que seca. Não é interessante que tenha só açaí, por isso esse esforço de manter a diversidade da floresta.”

dsc02171A alimentação dos peixes, no período inicial, é exclusivamente feita com ração. Após um certo tempo, há a introdução de outras fontes vegetais. Nesse ponto, o jovem Charles Samuel, morador de comunidade e estudante do curso de Tecnólogo em Piscicultura, no IFPA Castanhal, está pesquisando possibilidade de ração de peixes feita do Buriti, outra palmeira abundante na região.

Seu Dudu critica a visão de muitos ambientalistas “que acham que o homem só destrói a floresta. Antes tudo aqui era propriedade de portugueses, que saquearam tudo daqui. Antigamente, só se falava em extração. Só se tirava madeira, açaizal, e não se cuidava. De uns tempos pra cá, viramos extrativistas de uma outra forma. Não só extraímos, mas conservamos. E tentando melhorar mais.” 

Edel complementa: “É para a Humanidade que estamos protegendo, não só para quem vive aqui. Isso precisa ser reconhecido pelo mundo. Na Amazônia não é só bicho e árvore, aqui existem diversas formas de se organizar a vida.” E finaliza: “Aqui a gente não faz agroecologia – isso é a nossa vida.”