Cerca de 40 integrantes de organizações de todo o Brasil que integram a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) se reuniram entre os dias 02 e 04 de dezembro, em Tamandaré, na Mata Sul de Pernambuco, para traçar suas estratégias de para 2015. O seminário “Promovendo Agroecologia nos Territórios” teve como objetivo debater a promoção da agroecologia nos territórios tendo como ponto de partida os projetos aprovados no edital Redes Ecoforte e as chamadas de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) para Agroecologia, ambas iniciativas do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo). Além das diretrizes políticas para o próximo ano foram aprofundadas algumas análises sobre experiências agroecológicas nos territórios em todo o país, e realizadas visitas de campo na mata atlântica pernambucana.
A atividade ocorreu após um intenso processo de mobilização das organizações e movimentos, que resultou no III Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), realizado em Juazeiro (BA) em maio deste ano. A trajetória da ANA nos últimos anos vem aproximando cada vez mais segmentos de diversas áreas da sociedade para fortalecer o debate sobre a agroecologia e o modelo de desenvolvimento sustentável ao país. A aproximação dos quilombolas, indígenas, pescadores artesanais, agentes da saúde coletiva na perspectiva de aprofundar o debate com os consumidores sobre nossos alimentos, dentre outros setores, é fruto dessa construção.
Embora a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), decretada pela presidente Dilma Rousseff em 2012, seja uma vitória de todo uma luta do movimento agroecológico, as organizações têm avaliado que o cenário não tem sido favorável a avanços mais estruturais. As eleições deste ano foram acirradas, vencidas graças à mobilização da sociedade civil, mas o Congresso se tornou ainda mais conservador com uma bancada ruralista fortalecida. E o governo ainda tem sinalizado para o aprofundamento do modelo do agronegócio, que concentra terra, destrói a natureza e produz alimentos contaminados por agrotóxicos. Neste contexto que a ANA promoveu o seminário, e a partir do projeto Ecoforte, da Fundação do Banco do Brasil, visa elaborar caravanas agroecológicas em todas as regiões do país, seminários, estudos sobre os territórios, dentre outras iniciativas para o próximo ano.
De acordo com Denis Monteiro, secretário executivo da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), o seminário foi um marco histórico na trajetória da Articulação e dá seguimento à ideia fundadora da rede ao valorizar e visibilizar as experiências que vêm sendo desenvolvidas nos territórios. O princípio político e pedagógico da ANA de organizar as mobilizações a partir da realidade vivida dos agricultores e agricultoras continua como prioridade, complementou. Mais organizações estão participando da Rede, mas também há o avanço de projetos que são antagônicos ao desenvolvimento da agroecologia nos territórios, concluiu.
“Nos 12 anos da ANA foi muito intensa a presença da agenda das políticas públicas, no sentido de propor e negociar políticas que sempre foram objeto das nossas discussões. Temos uma ação organizada de incidência no plano nacional, nos conselhos, espaços em que a gente pauta e tensiona determinadas questões com o governo em defesa da agroecologia nos territórios. Há retrocessos, mas também algumas conquistas e muita reflexão sobre o que quais são seus limites e possibilidades. A ação do Estado para o fortalecimento da agroecologia é muito fragmentada, não há uma integração na atuação do Estado para essas políticas. E muito contraditória: alguns estados com muita coisa para o agronegócio e quase nada para a agricultura familiar. Esse seminário aprofundou esse debate para conhecer melhor o que tem acontecido nos territórios. Ter mais clareza das prioridades e estratégias, além de ter maior força política nos diálogos com o governo”, afirmou.
Segundo Maria Emília Pacheco, do núcleo executivo da ANA e presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão vinculado à Presidência da República, muitos avanços foram realizados nos últimos anos, como a construção da interação com o feminismo que tem se fortalecido. O diálogo sobre as identidades para aprofundar as análises sobre os biomas também foi apontado por ela.
“O seminário foi um elemento propulsor de vários debates, e precisa de uma leitura fina. Fazer esse grande mapa de dinâmicas de redes nas redes, com temas e atores diferentes dentro da ANA. Chama minha atenção o papel do extrativismo vegetal e o campo de compreensão da agroecologia nos biomas, articulados à leitura sobre a ação política dos povos e comunidades tradicionais. Isso vai permitir aprofundar o próprio conceito de agroecossistema. Embora o debate tenha ficado na Ater Agroecologia, fica o compromisso político com as outras Ater, como a indígena que pode desestruturar modelos tradicionais. Precisamos fazer esses diálogos e não ficar tão presos à análise do Planapo, e sim na relação direta com os territórios”, afirmou
Quatro experiências agroecológicas foram visitadas durante o encontro, todas evidenciando a difícil tarefa de desenvolver um modelo alternativo de agricultura em harmonia com a natureza no meio de monocultivos da cana de açúcar. A região é marcada profundamente pelos latifúndios com formas de trabalho semelhantes à escravidão. Mesmo assim organizações e movimentos sociais, juntos aos sindicatos locais, trabalham em defesa de uma alimentação saudável e outras formas de plantio e relações sociais. A Rede Agroecológica da Mata Atlântica (RAMA), composta por 24 organizações, também se apresentou no primeiro dia do encontro.