Por Alan Tygel e Camila Nobrega,
Na região de Pedra de Guaratiba, famílias de pescadores sofrem as consequências do processo de assoreamento da Baía de Sepetiba. Na Vila Autódromo, Zona Oeste, 500 famílias estão ameaçadas de remoção, em um cenário de quase 65 mil pessoas que estão sendo retiradas de suas casas no Rio. O perigo da remoção também ronda os agricultores do Maciço da Pedra Branca, que cultivam alimentos saudáveis.
O que une estas comunidades é a resistência aos problemas causados pelo modelo de desenvolvimento atual. Mas, além disso, elas se assemelham pela luta na construção de alternativas. Os três locais fizeram parte da rota da Caravana Agroecológica e Cultural do Rio de Janeiro, que termina hoje.
Durante 3 dias, os participantes percorreram a região metropolitana dialogando com comunidades afetadas por impactos ambientais e visitando experiências agroecológicas. Bernardete Montezano, da Rede de Agricultura Urbana, explica o objetivo da Caravana: “Queremos comunicar que nessa cidade existe agricultura.” Segundo ela, o próprio Plano Diretor extinguiu as zonas rurais do município. Isso significa que a prefeitura não leva em conta os agricultores, que ficam sujeitos ao pagamento de impostos urbanos, como o IPTU.
Leda Monteiro foi a primeira agricultora visitada pela caravana. Ela cultiva plantas medicinais em Pedra de Guaratiba. Caminhando por seu quintal, ela aponta: “Eu tenho amoxixilina, atroveran, dipirona, tudo no meu quintal. As pessoas nem tem dinheiro, mas vão à farmácia comprar remédio. Até mertiolate tem aqui.”
“Quando o pescador não consegue nada no mar, ele vira peão de obra.”
O Píer de Pedra de Guaratiba foi palco da abertura do evento. Considerado curativo nos anos 60, o local era frequentado por visitantes em busca de argilas medicinais. Segundo Oseias Marinho, 82, “vinha gente de Copacabana passar esse lodo no corpo. Agora, o lodo que você está vendo é outro: é veneno que sai da CSA e das outras indústrias.”
O pescador Ivo, morador de Sepetiba, afirmou que atualmente é impossível garantir a renda familiar por meio da pesca: “Quando o pescador não consegue nada no mar, ele vira peão de obra. É ótimo para as empresas, mas tirar um pescador do mar é como tirar um peixe da água.”
O segundo dia da Caravana começou na Vila Autódromo. Ameaçadas de remoção há 20 anos, as 500 famílias viraram um símbolo de resistência na luta por moradia no Rio de Janeiro.
Em meio à pressão exercida prefeitura para remover os moradores, chama a atenção a diversidade de argumentos utilizados pelo poder público para justificar as remoções. Entre eles, o mais contraditório é o que responsabiliza a comunidade pela poluição do meio-ambiente.
Nenhum dos condomínios de classe média da região possuem tratamento de esgoto, que vai direto para os córregos do bairro. Além disso, a atuação dos moradores da comunidade tem sido no sentido da preservação do meio-ambiente. É que conta Jane Nascimento, responsável por horta comunitária recém-criada na Vila Autódromo: “A prefeitura quer nos derrubar de qualquer jeito, e a horta veio para unificar os moradores.”
O agricultor Francisco Caldeira também enfrenta ameaça de remoção, por conta da implantação do Parque Estadual da Pedra Branca, que tornou a terra onde a família dele mora há mais de cem anos uma área de proteção integral,em Vargem Grande. Elee mais 300 produtores rurais cultivam alimentos sem agrotóxicos.
“A gente já fazia agroecologia sem saber. Sou contra essa coisa de orgânico, que é só para vender mais caro e na Zona Sul do Rio. Agroecologia é para produzir alimento para os pobres.”
A Caravana segue nesta quintaem Nova Iguaçu. Emmaio de 2014 o III Encontro Nacional de Agroecologia irá juntar os resultados trazidos pelas 9 caravanas que percorreram o país. O objetivo é implementar ações que possam tirar do Brasil o título de maior consumidor de agrotóxicos do mundo.
(*) Membros da Rede de Comunicadores Populares do Rio de Janeiro. Parceria do Canal Ibase com o Brasil de Fato.