Também alvo das manifestações que estão ocorrendo em todo o Brasil, a mídia é apontada por milhares de pessoas como um dos pilares de sustentação do atual modelo político e econômico. Por meio de sua ideologia, alinhada às grandes empresas, induz a sociedade a consensos que não são necessariamente adequados à maioria da população. Esse é o caso dos agrotóxicos e transgênicos, que são sistematicamente apresentados ao público como a salvação do meio rural.
Coordenador Nacional da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, Cleber Folgado, do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), dá exemplos de manipulação das informações sobre o tema. Segundo ele, é preciso recorrer a outros instrumentos de comunicação para informar a população, pois os veículos tradicionais estão alinhados ao grande capital internacional.
Como a Campanha vê a forma que a sociedade é informada sobre os agrotóxicos?
Na verdade existe um processo de negação da informação para o conjunto da sociedade sobre a realidade concreta dos impactos na saúde e no meio ambiente em relação aos agrotóxicos e os transgênicos. Esse processo todo é invisibilizado porque a mídia burguesa, dentro dos seus monopólios, vive uma aliança com o capital financeiro transnacional, as empresas transnacionais, que conformam o agronegócio. De modo que chega para a sociedade informações de supostos benefícios em relação a transgênicos e agrotóxicos. Informações falsas, por exemplo: sem agrotóxicos não se consegue produzir alimentos baratos para alimentar o conjunto da sociedade. É uma informação falsa porque 70% da alimentação produzida vêm da pequena agricultura e não do agronegócio, que produz commodities para a exportação. Outras informações, como: esse conjunto de entrada de divisas internacional é o que garante a balança comercial e facilita a manter a economia, manter a própria inflação. Também é falso, tendo em vista que os custos que o agronegócio tem são na verdade bancados pelo próprio estado. Ou seja, ele coloca dinheiro através de créditos e outras formas de subsídio para que o agronegócio possa produzir. Quem acaba lucrando com isso são as empresas, na medida em que suas remessas de lucro são enviadas para os seus países de origem e não permanecem aqui. Então a sociedade tem sido impedida de ter acesso às informações reais do que acontece em relação à problemática de agrotóxicos e transgênicos. Ainda tem também, por exemplo, os efeitos na saúde, tanto crônicos quanto agudos. Os problemas que os transgênicos vão gerar em relação à maior utilização de agrotóxicos: na medida em que os transgênicos entram no Brasil, esse número vai triplicar, causar impactos ambientais, sociais, econômicos, etc. Isso tudo é negado a sociedade.
E como se dá essa percepção na formação acadêmica e científica?
Do ponto de vista da academia, que é outra abordagem interessante para a gente pensar essa relação, temos poucas pesquisas voltadas para estudar de fato quais são esses impactos no conjunto da sociedade. Ou mesmo em focos mais específicos, como meio ambiente e saúde, por exemplo. Porque em grande parte quem banca os estudos, que geralmente são caros, é a empresa que muitas vezes faz isso para garantir sua boa imagem em relação ao que acontece nas influências de agrotóxicos e transgênicos.
A Campanha fez uma parceria com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e produzimos um dossiê com um conjunto de informações a partir de textos científicos, que vão abordar especificamente quais são os problemas ambientais, de contaminação da água, do solo, da terra, extermínio de populações de abelhas, de minhocas, mutação nos próprios animais, sapos, peixes, etc. Trazemos toda essa problemática do ponto de vista científico, e também no campo da saúde: geração de aborto espontâneo, aumento do índice de cânceres, etc. É uma abordagem que do ponto de vista ideológico também disputa a sociedade, disputa a opinião pública, porque hoje existe um poderio da academia. O que é ciência é poder, o que vem da academia é reconhecido como verdadeiro, então também fazemos essa abordagem para colocar essas informações para a sociedade. Não só para legitimar o nosso discurso, mas também visibilizar os problemas que acontecem em relação aos agrotóxicos e transgênicos.
O que vocês têm de forma propositiva nesse sentido?
Usamos muitos veículos alternativos. A gente fez, por exemplo, o documentário “O Veneno Está na Mesa”, com o Silvio Tendler, e estamos fazendo o segundo. O primeiro dá ênfase na denúncia da problemática em relação aos agrotóxicos, e o segundo nas alternativas em agroecologia. Mas a gente tem utilizado outros mecanismos, como as próprias redes sociais. A Campanha tem um site, e ela própria se tornou um importante instrumento onde as pessoas têm buscado informações atualizadas em relação a tudo o que está acontecendo de agrotóxicos. Desde o que está rolando na Câmara Federal, na Assembleia, no mundo científico, e tentamos produzir alguns materiais como cartilhas voltadas para estudantes do ensino médio e pessoas que querem ajudar a construir a Campanha. São informações sobre como formar um comitê, quais são os debates colocados, os elementos mais importantes nessa construção, e tentar promover outros instrumentos de participação popular que possam também garantir o acesso a informação, tais como as audiências públicas nos municípios. Estas às vezes são mais focadas numa pauta ou outra, temos, por exemplo, o caso do fim da pulverização aérea a partir do caso da pulverização da escola de Rio Verde. O avião pulverizou e 28 crianças ficaram intoxicadas, professores e diretores, e isso também deu uma visibilidade. Temos aproveitado para fazer audiências para discutir a pulverização, e nesse sentido você vai discutir toda a problemática dos transgênicos e dos agrotóxicos. Então tentamos utilizar todos os instrumentos possíveis, desde materiais impressos, meios digitais, e momentos de participação coletiva em que as pessoas possam estar presencialmente para discutir e colocar suas opiniões. E assim construir uma reflexão mais coletiva em torno da problemática que gera o agrotóxico e transgênico, e das possibilidades e alternativas que a agroecologia gera.
(*) Foto: EPSJV/Fiocruz.