alexandre piresPor Nathália D’Emery,

Na última entrevista da Série Seca, conversamos com Alexandre Henrique Pires, coordenador geral do Centro Sabiá. Ele falou sobre a falta de políticas públicas para prevenção da seca e sobre a importância desta série para o debate e conscientização da população.

Centro Sabiá – Convivência com o Semiárido ou combate à seca?

Alexandre Pires – Sem dúvida nenhuma, convivência com o Semiárido. Eu acho que ao longo do tempo que a gente vem discutindo as políticas para a região, para e com a população do Semiárido, vem mostrando que a ideia e o conceito de combate à seca não cabe mais, nunca coube e só reforçou interesses privados, interesses que não ajudam a população do Semiárido a conviver com o ambiente em que elas vivem.

Centro Sabiá – Ao longo das nossas entrevistas as respostas realmente foram para o caminho da convivência com o Semiárido, mas em muitos momentos as políticas apresentadas tinham um caráter emergencial de combate à seca. Como parte do Centro Sabiá, qual a sua opinião sobre esse tipo de política pública?

Alexandre Pires – Acho que essa pergunta vem mostrando de fato que há uma opção clara por parte das organizações da sociedade civil como um todo pelo conceito de convivência com o Semiárido. No entanto, os programas e políticas governamentais ainda não conseguem conceber e não adotam o conceito de convivência na construção das políticas. É interessante colocar que quando a gente fala de convivência, estamos falando de construir formas, jeitos, estratégias para que a população que vive nas regiões semiáridas, consiga conviver, viver na sua propriedade, viver na sua casa, trabalhando na roça, cuidando dos animais sem precisar sair para outras cidades por causa da seca, que é uma situação que nós vamos vivenciar por vários anos ainda pra frente, porque é um fenômeno natural. Aí quando estamos falando destas estratégias, das formas de fazer, estamos falando da importância da cisterna, estamos falando da importância de estocar alimentos, ração para os animais, de estocar as sementes nativas, as sementes e grãos de feijão, de milho, de sorgo, de várias outras plantas que os agricultores produzem. A gente está falando da importância do manejo dos animais com os remédios naturais da Caatinga, a gente está falando do manejo da Caatinga. Falamos também de não queimar, de reflorestar. Diferente dos programas de políticas de combater à seca. No entanto o estado brasileiro, os governos dos estados e os governos municipais até hoje nunca construíram um programa e um plano de prevenção, um plano que cuide, que dê atenção à população, principalmente rural, para o período de estiagem, que é recorrente. Todos os anos a gente tem quatro meses de chuva em média e oito meses de estiagem. Mas até hoje nenhum governo elaborou nenhum plano que atenda as necessidades da população, no sentido de prevenir determinadas situações. Então duas coisas são importantes: a gente precisa de um plano de prevenção à situação de seca, de estiagens, assim como a gente precisa de um plano de emergências para o momento que acontecer as secas. Até hoje a gente não tem.

Centro Sabiá – Estamos fechando hoje a primeira fase da nossa série especial sobre a seca. Como você vê a criação em conjunto do Centro Sabiá de tratar esse tema a cada domingo, e o uso do rádio como ferramenta social?

Alexandre Pires – Essa sua pergunta me leva a rememorar que o Centro Sabiá, juntamente com a Diocese de Afogados da Ingazeira, com a FETAPE, com os vários sindicatos, várias cooperativas, outras ONGs, como é o caso do CECOR lá em Serra Talhada, da Casa da Mulher do Nordeste, da Diaconia, o Caatinga lá na região do Araripe, foram organizações que foram pioneiras no estado de Pernambuco na discussão sobre a convivência com o Semiárido. Lá na década de 80 iniciou-se os processos de mobilização, de reivindicação de políticas mais afirmativas, de políticas mais estruturais para melhoria das condições da população que vive no Semiárido, principalmente nesse período de estiagem. Então o Centro Sabiá, que fez parte desse processo do Fórum Seca, que deu origem mais tarde à ASA [Articulação no Semi-Árido Brasileiro] lá no início dos anos 2000. O Fórum Seca em Pernambuco teve um papel muito importante no sentido de mobilizar a população, no sentido de construir com as pessoas estratégias para que essas situações de seca que a gente vai vivenciando a cada momento fossem menos impactantes na vida das pessoas. A gente vem, de fato, dentro dos conselhos nacional, estaduais e nos conselhos municipais reafirmando a importância da ASA como uma articulação que contribui de forma significativa para mudar a vida das famílias do Semiárido. Como nós estamos vivenciando esse processo de seca, a ideia de fazer essa série de entrevistas com pessoas de ONGs, das universidades, das instituições de pesquisa e dos próprios governos é exatamente no sentido de trazer diversas opiniões para que a população tenha a opção de escutar várias opiniões e formular também a sua crítica a essa situação que a gente vive, que de certa forma ainda é uma situação bastante complicada porque não estamos vendo no concreto, no caso na zona rural, essas políticas e esses programas de emergência dos governos se efetivarem. Então acho que isso foi uma idéia de levar opiniões para também ajudar a população a refletir sobre isso. E acaba uma temporada agora, mas a gente começa uma outra temporada refletindo um pouco mais com outras dimensões, com outras questões que não são mais de entrevistas mas são também de educação, de esclarecimento da população sobre essa situação.

(*) Reprodução do Centro Sabiá. Colaborou Sara Brito.