Espera Feliz (MG) – Ao final das três rotas da Caravana Agroecológica e Cultural da Zona da Mata, na noite do dia 23, todos se encontraram na praça de Espera Feliz (MG), onde houve um ato cultural e político. Após uma roda de capoeira e a fala de algumas lideranças, os participantes seguiram em cortejo, distribuindo no caminho panfletos sobre a agroecologia, para o ginásio poliesportivo da cidade. No local, representantes dos movimentos e do governo federal se manifestaram, e em seguida ocorreu uma mística louvando a cultura negra. Também estavam presentes deputados e prefeitos, dentre outros representantes.
Mais de 20 organizações foram anunciadas, todas em busca de uma maior integração com a mãe natureza, no sentido de buscar formas diferenciadas de produzir e se relacionar com o ambiente, explicou Mariana da Silva Correia, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Espera Feliz. Segundo ela, algumas entidades estão há quase 30 anos atuando na zona da mata, o que resultou na criação de algumas políticas públicas. “Precisamos fortalecer e potencializar a agricultura familiar agroecológica, políticas hoje como PRONAF, PNAE, PAA, etc. Mas queremos mais, porque protegemos as nascentes, caminhamos em direção à saúde, temos a missão de alimentar a nação”, reivindicou
O deputado estadual Rogério Correia (PT) e o Superintendente de Agricultura Familiar de Minas Gerais, José Antônio Ribeiro, falaram sobre a agroecologia em Minas Gerais. Eles destacaram a necessidade de o poder público dar sustentação às iniciativas locais, e elogiaram um projeto de lei, que foi aprovado na Assembleia Legislativa, para regulamentação da agricultura familiar no estado: assistência técnica, comercialização, planejamento, etc. Em setembro haverá um encontro estadual em defesa do desenvolvimento rural sustentável. O deputado federal Padre João (PT), por sua vez, criticou a erosão na política, sobretudo no Congresso e Senado, causada pelo poder econômico.
Segundo o secretário executivo da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, Selivno Heck, que representa a Secretaria-Geral da Presidência da República, apesar de todos os problemas enfrentados e contradições no mundo, Brasil e às vezes no governo, estamos caminhando para a realização de sonhos. Nesse sentido, ele destacou a Política Nacional de Agroecológica e Produção Orgânica (PNAPO). “No próximo dia 07 haverá uma reunião de ministros para o lançamento, queremos ver a presidenta Dilma dizendo sim para agroecologia e produção orgânica nesse processo com a sociedade. Plano que discute a construção do conhecimento, comercialização e consumo, agrotóxicos, conjunto de temas que vocês têm construído também na experiência concreta”, afirmou.
A caravana é uma ideia muito feliz, porque permite trazer e evidenciar para a sociedade brasileira parte daquilo que os agricultores estão construindo há anos, ressaltou Silvio Porto, diretor de Políticas Agrícolas e Informações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Ele também defende mudanças no marco legal, pois, em sua opinião, ainda vivemos um processo de criminalização das organizações sociais. Temas como a produção, participação das mulheres e jovens, relação com a cidade, dentre outros, também estão sendo discutidos mais publicamente, complementou o gestor.
“Temos trabalhado o PAA [Programa de Aquisição de Alimentos] como um processo de valorização e mudança da relação e soberania alimentar que a agricultura tem no local. Estratégia de encurtar os espaços de quem produz e quem consome. Buscar outras estratégias de mercado, tem evoluído muito nos últimos anos. Isso permite debater a relação da produção, agricultura com a natureza, e temos conflitos com as mineradoras, o agronegócio, por isso essa produção não tem conseguido colocar a pauta no debate político”, observou.
De acordo com o Alexandre Pires, do Núcleo Executivo da ANA e coordenador do Centro Sabiá, a caravana permitiu mostrar como a agroecologia é feita na prática com sistemas agroflorestais diversificados, a participação de políticas públicas, e o envolvimento de diversos setores da sociedade. Para ele, as famílias mostraram como é possível produzir de forma agroecológica gerando renda, inclusão e preservando nossos recursos naturais.
“A rota permitiu visitar várias experiências dos agricultores, ações de impacto do agronegócio, especialmente o mineroduto. Em Visconde de Rio Branco conversamos com algumas pessoas e percebemos que os desafios estão colocados, mas essas experiências mostram a força que ao agricultor tem quando consegue se organizar. Capacidade de reagir ao processo de desterritorialização mesmo com falta de estrutura. Fizemos manifestações públicas e culturais, como a agroecologia se expressa nos elementos da música, terra, vida, sentimento das pessoas, alegria do espaço de viver”, disse.
A valorização do saber local também foi citada por Sara Pimenta, do Núcleo executivo da ANA e integrante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). Sua avaliação é que os movimentos ainda têm muitos desafios, mas saem da caravana fortalecidos e com maior capacidade de intervenção nos lugares que atuam no contexto da PNAPO.
“Percorremos histórias de vida, de resistência, luta, produção, aprendizados, trocas, e principalmente desse sentimento. Conseguimos constatar que a agroecologia é um modo de produzir com respeito à vida, aos saberes, temos a esperança e convicção que estamos no caminho certo. Visitamos um conjunto de experiências que mostram a capacidade extraordinária da agroecologia, o seu amor e paixão pela terra”, concluiu.
Na manhã do dia 24 houve a mística final na cachoeira do Parque Nacional do Caparaó. Todos se abraçaram, trocaram mensagens relacionadas à sustentabilidade do planeta, e foi realizada uma apresentação enaltecendo a cultura negra. A figura de Oxum, uma das divindades da religião africana, foi representada durante o encerramento.
(*) Fotos: Wanessa Marinho e Gabriel Novais/CTA.