Por Daniela Bento – Comunicadora Popular da Rede Sergipe/ SASAC
A militância do Movimento dos Pequenos Agricultoras e agricultores do estado de Sergipe, (MPA), se reuniu em Poço Redondo, no ultimo dia 02 no intuito de identificar os limites da produção agroecológica no atual contexto brasileiro, dentro da construção do plano camponês. O momento surgiu da necessidade de organizar elementos, ideias, reflexões e acúmulos acerca da prática agroecológica e localizar no plano camponês a relevância do campesinato para a produção de alimentos saudáveis.
Dentro dessa lógica o Movimento solicitou a apresentação da pesquisa Sistemas Agrícolas Familiares Resilientes a Eventos Ambientais Extremos no Contexto do Semiárido, do Instituto Nacional do Semiárido (Insa/MCTI), em parceria com a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA Brasil), (ASA/INSA), a fim de perceber como esta poderá contribuir com o desafio do campesinato.
A bolsista da pesquisa em Sergipe, Iva Melo, apresentou de modo geral os resultados e deu ênfase aos gráficos que analisam os resultados econômicos de dois agroecossistemas estudados no Semiárido sergipano. Um que possui o modelo de produção mais especializado e com um volume de terra de aproximadamente 176 hectares e outro com apenas 1,8 hectares e com uma produção altamente diversificada. As experiências estão localizadas respectivamente, nas comunidades de Poço Redondo e Porto da Folha.
Um dado interessante nessa pesquisa é a agregação de variáveis desconsiderada na lógica convencional dos cálculos econômicos. Ao analisar a renda monetária agrícola, ganhos e custos da produção foram considerados nessa análise: Produto Bruto, aqui definido como: PB = Autoconsumo + Trocas e Doações + Vendas + Estoque, Renda Bruta (RB) = Vendas + Trocas e Doações + Autoconsumo, Valor Agregado VA = RB – CI ( Consumo Intermediário, ou seja, custos da produção) e por fim , a Renda Agrícola, ou liquida do agroecossistemas, RA = VA – CI.
Quando comparados entre si, considerando a área total de cada um, temos o seguinte quadro:
No entanto, quando analisada a produção por hectare, a pesquisa revela o quanto a produção especializada é inviável ao campesinato. Enquanto a especialização produz uma renda liquida de apenas R$ 370,00 por ha o diversificado produz R$ 6.186,00.
A pesquisa ainda analisou o agroecossistema diversificado sem inovações tecnológicas e com inovações, como, cisternas, biodigestor, sistema PAIS, eco fogão, entre outras, conquistadas através de programas e políticas públicas.
Se antes das inovações o agroecossistema produziu um renda agrícola anual de R$ 6.078,00 com as inovações, tem um crescimento de quase 145%, atingindo a cifra de R$14.843,00.
Para a militância do Movimento dos Pequenos Agricultores de Sergipe, a pesquisa ganha bastante relevância, por mostrar de forma empírica o que o campesinato já sabe, mas, que tem extrema dificuldade de comprovar, visto que para legitimar o avanço do agronegócio há um vasto material produzido, pesquisado e compilado. Mas, em relação às práticas camponesas, segundo o Movimento, ainda há muitas lacunas na pesquisa cientifica, além de que revela explicitamente os modelos de produção em disputa no campo brasileiro, como destaca a militante Rafaela Alves, dirigente do MPA nacional.
“A pesquisa é fundamental, e é desse tipo de pesquisa que o campesinato e o Semiárido precisam para que os camponeses e camponesas consigam analisar e compreender aquilo que é viável e compatível com o projeto de sociedade que a gente defende. Nesse sentido a pesquisa nos revela os modelos de agricultura em disputa: a familiar e a camponesa e o que cada uma gera, seus processos econômicos, ambientais e políticos também. O campesinato precisa compreender melhor suas escolhas, pois quando se faz uma opção por um modelo em detrimento do outro é uma escolha política. O modelo de agroecossistemas especializados na pesquisa, pra nós é a tradução do conceito de agricultura familiar, tão difundido e defendido até por algumas organizações, ou seja, não é o agronegócio, mas também não é o campesinato”, salienta Rafaela.
Já para Thais Moura, estudante de geografia, na Universidade Federal de Sergipe e pesquisadora do agronegócio, a pesquisa ganha um caráter inovador ao abordar de forma empírica os ganhos da produção agroecológica. “Atualmente eu pesquiso a questão dos agrotóxicos no campo sergipano e como eles afetam a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras rurais. E a pesquisa impressiona pelo fato de que normalmente não se tem essa dimensão de como a agroecologia dá resultados. Por que o que a gente vê na maioria das vezes é discurso. E a pesquisa mostra na prática que funciona e que deve ser difundida. E eu como estudante do agronegócio vi que há uma saída para esse modelo de produção. Então achei incrível a pesquisa e fiquei muito feliz de está aqui para assistir, pois abriu novas possibilidades de pesquisas para mim, nesse campo da agroecologia porque vi aqui de forma empírica como a agroecologia funciona”, diz.
Ana Paula, do coletivo de produção do MPA, destaca que a pesquisa ajuda a consolidar um trabalho que ela vem fazendo no sentido de mostrar a inviabilidade econômica da produção especializada do leite. Segundo ela, o estudo quer provar que os gastos com a produção de leite traz prejuízo ao produtor se não houver, na propriedade, outras estruturas de produção integradas. “Uma vaca gasta por semana R$ 60,00 só com ração comprada, sem considerar a palma e o rolão de milho que alguns camponeses e camponesas possuem. Para você tirar isso no leite precisa ser uma vaca muito boa de leite e fazer duas ordenhas diárias, e infelizmente a realidade da maioria é ficar mesmo no prejuízo”, afirma Ana Paula.
Para o MPA a pesquisa precisa agora chegar a todas as bases como forma de provocar de maneira radical a mudança do paradigma de produção e consolidar o plano camponês no estado. Para tanto, será construída uma agenda com a bolsista da pesquisa a fim de que mais camponeses e camponesas tomem conhecimento e se apropriem da pesquisa.