O Projeto de Emenda Constitucional (PEC 06/2019) da Reforma da Previdência enviado ao Congresso Nacional em fevereiro deste ano foi um dos assuntos debatidos no Encontro de Planejamento do Polo da Borborema, realizado nos dias 26 e 27 de março, em Arara-PB. Na tarde do primeiro dia, o advogado trabalhista e previdenciário Joseilson Luís Alves, foi o convidado para tratar sobre o assunto. Ele dividiu a sua fala em dois momentos, um primeiro falando sobre o histórico de direitos previdenciários conquistados pelos trabalhadores rurais e um segundo tratando das mudanças que a proposta de reforma prevê, bem como o seu impacto na vida dos trabalhadores do campo em especial.
O advogado lembrou que só em 1972, os trabalhadores rurais passaram a ‘existir’ para a Previdência Social, podendo os homens se aposentar com 65 anos, tendo direito a meio salário mínimo, comprovando 15 anos de atividade no campo. Só com a Constituição de 1988, os benefícios foram fixados no valor do salário mínimo, incluiu-se a agricultora e criou-se a categoria de ‘segurado especial’ regida por uma lei específica: “Esse não é só um nome bonito. A condição de segurado especial foi uma conquista dos trabalhadores rurais porque eles contribuem sim, e muito, com a riqueza do país”, frisou.
Com relação às alterações que a PEC da Reforma propõe, o advogado destaca o aumento de 15 para 20 anos de carência; a instituição do pagamento do valor de R$ 600,00 de contribuição anual e a redução do valor do amparo social ou BCP (Benefício de Prestação Continuada), de um salário mínimo para R$ 400,00, além de aumentar a idade para 70 anos. Nas regras atuais, o benefício é concedido a idosos em situação de miserabilidade a partir dos 65 anos, as pessoas com deficiências física, mental ou portadores de necessidades especiais.
O especialista alerta que as mudanças vão contribuir para a retirada de muitas pessoas do regime de previdência: “Imagino que a leitura de quem propôs isso é a de que com essa previdência, haverá um exército de agricultores que não vão conseguir se aposentar e vão buscar o amparo social, então se reduziu o valor do amparo para poder suportar essa demanda no sistema de assistência social. E o pagamento do benefício após os 70 anos é porque se sabe que na miséria, ninguém vive muito”, provocou.
Por fim, Joseilson avalia que contrariando os argumentos do governo de que a reforma é necessária diante de um alegado déficit e que vem para combater privilégios, não são cobrados os altos valores dos grandes devedores da Previdência e a proposta acaba tirando de quem já tem muito pouco: “O Estado Brasileiro está se retirando do seu papel de prover uma aposentadoria para quem não pode mais trabalhar”.
Conjuntura atual
Antes do debate sobre a Previdência, os participantes do encontro se dividiram em grupos e levantaram ações importantes no ano de 2018 de reação do movimento sindical da região diante da conjuntura de avanço do conservadorismo e retirada de direitos. Foram lembradas as seguintes ações promovidas pelo Polo da Borborema em parceria com a AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia: momentos de debate sobre as eleições e diálogo com candidatos e parlamentares eleitos do campo popular democrático; o tema da diversidade sexual trazido pela Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia de 2018; as audiências, mobilizações contra a Reforma da Previdência e contra o fechamento das escolas do campo; a comercialização do fubá livre de transgênicos na rede de feiras agroecológicas e os temas de atualidade sendo debatidos na rede de programas de rádio do Polo, entre outras ações importantes.
Nova Diretoria
Durante o encontro foi aclamada a nova diretoria, eleita para os dois próximos anos, uma espécie de coordenação jurídica do Polo da Borborema, que é uma rede formada por 13 sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras rurais da região da Borborema que atua há 25 anos com a assessoria da AS-PTA. A nova formação tem 11 membros, sendo 4 homens e 7 mulheres, destes um jovem e uma jovem. “O momento político não é fácil, gostaria de agradecer a oportunidade e dizer que estamos aqui enquanto juventude reafirmando o nosso compromisso com a luta do Polo”, disse Adailma Ezequiel, de 28 anos, jovem do Sítio Capoeiras, município de Queimadas.
10 anos de Marcha
No segundo e último dia de evento, o encontro reservou um momento para avaliação da décima edição da Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, realizada em 2019 no dia 14 de março, levando cerca de 6 mil mulheres as ruas de Remígio-PB. O tema aprofundado foi o do racismo e a vida das mulheres negras, sendo inclusive realizada na data de um ano de assassinato da vereadora negra Marielle Franco. “Foi muito importante a articulação que foi feita entre campo e cidade, de também chamar as mulheres da cidade para estarem presentes. Para muitas delas aquele dia é uma festa, mas sem esquecer do papel de denúncia. Quiseram calar Marielle, mas nós fomos a rua e fizemos muito barulho por ela e por todas nós. Também a importância do envolvimento das escolas, que até semanas após a marcha continuaram trabalhando o tema em sala de aula”, avaliou Jeane Carla Medeiros, 24 anos, jovem do assentamento Queimadas, Remígio-PB.
“Falar desses 10 anos de Marcha é nos perguntarmos que homens e mulheres, que sindicalistas nós somos e que homens e mulheres sindicalistas nós queremos ser, ou mais, que sociedade nós somos e que sociedade queremos ser. Nesses 10 anos já encontramos muitas destas respostas e seguimos buscando mais. O importante é que nós mulheres não vamos mais aceitar piadas machistas nem na rede social, nem na rua, não vamos mais aceitar a violência, a mulher quer respeito”, disse Giselda Bezerra, liderança do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Remígio-PB.
Na parte final do evento, houve as reuniões das redes temáticas (Saúde e Alimentação; Sementes; Juventude e Agrobiodiversidade; Recursos Hídricos e Acesso a Mercados), momento em que os agricultores e as agricultoras integrantes de cada rede construíram o seu planejamento das atividades para 2019, bem como estratégias de luta política.