Colatina (ES) – Cerca de 40 integrantes da Caravana Territorial da Bacia do Rio Doce realizaram ontem (13), com apoio da Diocese local, organizações e moradores um ato político na praça da Catedral de Colatina, no Espírito Santo. A principal crítica dos moradores foi o fato de o prefeito Leonardo Deptulski (PT) ter liberado a partir de dezembro a água do Rio Doce para a cidade. Depois do desastre da barragem da Samarco/Vale foram distribuídas águas potáveis pela empresa aos moradores. Durante o ato distribuíram panfletos e explicaram o objetivo do evento.
De acordo com o padre Josemar Miranda, coordenador da Diocese, é preciso cobrar das autoridades punições severas e estudar para saber o real impacto ambiental e social do desastre. Ele está preocupado com o que chamou de vítimas silenciosas, que podem lotar os hospitais locais no futuro. “Vivemos uma situação de morte, várias populações perderam suas formas de sobrevivência. Essa tragédia não pode ser esquecida por nós, pelo poder público e a empresa. Está ocorrendo em plena crise hídrica”, disse.
“A caravana surgiu da necessidade de denunciar as áreas atingidas, mostrando os impactos, anunciando outros modelos de desenvolvimento na região e para mobilizar as comunidades afetadas. Vamos compartilhar esses olhares em Governador Valadares (MG) para brigarmos juntos. A riqueza do encontro é promover as trocas entre indígenas, quilombolas, pescadores, agricultores e outros prejudicados”, explicou Simone Batista, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e da comissão organizadora da caravana.
Embora o rio estivesse bastante assoreado, ele ainda não estava morto, avaliou Araújo, da Associação de Pescadores de Colatina. Segundo ele, os moradores nunca imaginaram que uma coisa dessas poderia acontecer e hoje estão pagando pela água e os peixes contaminados. “O prefeito liberou essa água, e o pronto socorro está cada vez mais cheio. A Samarco está honrando seus compromissos, agora é ver se vão prorrogar. Liberaram a pesca aqui, mas em Linhares não está. Como, se o rio é o mesmo? Aqui ninguém está comprando, estamos abandonados. O povo está usando essa água, porque não tem opção: tem que usar e comer o que eles dão”, afirmou.
Integrante do Fórum S.O.S Rio Doce Colatina, Nico Dias pontou que as obras das Adutoras Fonte de Captação Alternativa estão paradas, e a distribuição da água do Sanear foi liberada para creches e escolas do município. “Outro ponto defendido pelo fórum local é a implementação de análises independentes, com participação da população em parceria com as instituições de ensino federais da cidade e do Estado”, complementou.
O Fórum Ecumênico da Juventude e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais locais manifestaram apoio aos atingidos pela lama tóxica da empresa, eles exigem que o estado assuma os prejuízos. Todos estão preocupados com as crianças, que estão bebendo essa água nas creches e escolas desde que a Samarco parou de distribuir os caminhões pipas e a prefeitura disse que estava boa para o consumo. Alguns moradores relataram que estão buscando a água em minas de Colatina.
“O objetivo é fazer com que a voz não se cale, e queremos justiça. Mas a justiça está comprada, se não essa empresa já teria sido punida”, criticou Sonia, do Sindicato local. A agricultura familiar, segundo Maria Emília, também do sindicato, atravessa uma severa escassez de água e a televisão não revela as verdadeiras questões importantes à sociedade.
“Temos 15 vereadores e 30 deputados estaduais, e não vi nenhum. O judiciário e o poder público não nos representam. Também tem a plantação de eucalipto expulsando os pequenos produtores, estamos nos tornando um deserto. E os pescadores são os mais atingidos, sem falar a água que está imprópria para beber”, contestou João Maria, líder ribeirinho da região.
“Não roubaram só os peixes, levaram a dignidade das pessoas. Porque receber da Samarco não resolve, o pescador quer trabalhar e se sentir útil”, criticou um dos afetados.
Ao final do ato foi exibido na praça um vídeo gravado na Vila Regência, em Linhares, que demonstra através dos relatos dos moradores os impactos da lama tóxica na comunidade que é caracterizada pela pesca, o turismo e o surf.