I Seminário da RENDA/NE articula núcleos de agroecologia de diferentes territórios do nordeste
Bolo de macaxeira e batata doce, pães de cenoura, cebola e mandioca, pastinhas, biscoitos, doce de leite, frutas da época, doce de banana, suco de acerola e um café quentinho. Assim, num ambiente permeado de sabores, vindos da produção agroecológica da região metropolitana de Recife e da Feira Agroecológica das Graças, em Recife, as pessoas começaram a se conhecer e se reconhecer enquanto Rede de Núcleos de Agroecologia. Assim foi o início do I Seminário Regional da Rede de Núcleos de Agroecologia do Nordeste, apoiado pela Chamada MDA/CNPq No 39/2014.
A atividade ocorreu entre os dias 01 e 02 de setembro, na Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Geografia, em Recife e reuniu cerca de 40 pessoas, entre professores, pesquisadores, bolsistas, estudantes e técnicos. O objetivo principal foi aproximar os núcleos, traçar estratégias de comunicação em rede e debater as ações para a construção do conhecimento agroecológico nas Instituições de ensino, pesquisa e extensão da região Nordeste. Além das diretrizes políticas que orientam as ações dos Núcleos de Agroecologia (NEAs) e os Centro Vocacionais Tecnológicos (CVTs) nos territórios, foram aprofundadas questões importantes como a sistematização de experiências e a construção de uma agenda estratégica.
Tecendo Redes: os desafios, as fragilidades e os avanços na construção do conhecimento agroecológico nas instituições de ensino, pesquisa e extensão
O primeiro dia foi dedicado ao reconhecimento mútuo. Uma instalação pedagógica, montada no centro da roda, evidenciou as experiências de cada território. Do Maranhão veio o licor de mangaba, as sementes crioulas e o foco com o trabalho no extrativismo; Já o Piauí mostrou o trabalho com as feiras agroecológicas, dinamizada pelo núcleo Cajuí. O Ceará visibilizou a atuação com a residência agrária em assentamentos rurais e o jogo pedagógico, construído junto com trabalhadores e trabalhadoras rurais impactados pelo uso dos agrotóxicos na região do baixo Jaguaribe, afirmando a agroecologia como contraponto ao modelo do agronegócio. Do Rio Grande do Norte vieram as sementes crioulas e de adubação verde. Depois foi a vez da Paraíba, com o grupo NERA e a rica atuação com os movimentos sociais do Polo da Borborema. Pernambuco ressaltou as experiências na Zona da Mata, nos sertões do Pajeú, Araripe e São Francisco, e a organização da II Jornada dos Povos de PE.
A instalação foi crescendo com a contribuição de Alagoas, que mostrou o cultivo de hortaliças em quintais urbanos, na cidade de Murici, além do trabalho com as sementes nativas e de adubação verde; Sergipe demonstrou que as pesquisas participativas tem sido importantes para a construção da agroecologia na Embrapa Tabuleiros Costeiros, na Rede Sergipana de Agroecologia (RESEA) e na parceria com os movimentos sociais rurais; a Bahia, último estado a se apresentar, enriqueceu a roda com os trabalhos em Feira de Santana e Salvador junto das comunidades quilombolas e dos assentamentos rurais, além de ressaltar a participação dos núcleos de agroecologia no Fórum Baiano de combates aos agrotóxicos e no lançamento do dossiê da ABRASCO.
A diversidade no centro da roda evidenciou os desafios, as fragilidades e os avanços na construção do conhecimento agroecológico dentro das Instituições de Ensino Superior (IES), tema central debatido nos grupos de trabalho. Foram apontados como desafios para a construção do conhecimento agroecológico a necessidade dos NEAs e CVTs se aproximarem mais dos movimentos sociais para construírem o diálogo de saberes e assim terem melhor compreensão do sentido político da agroecologia. Dentre as fragilidades, o modelo de produtividade adotado nas Universidades foi apontado como grande problema, pois se choca com as as atividades e a temporalidade das pesquisas agroecológicas. Além disso, no âmbito do ensino, os professores envolvidos na educação e nos cursos de agroecologia ainda carecem de uma formação voltada para agroecologia. Por fim, as chamadas públicas apoiadas por editais do MDA/CNPq para NEAs e CVTs e a criação de disciplinas voltadas a formação em agroecologia foram apontados como avanços importantes.
Embora as chamadas públicas tenham sido um incentivo para a formação e a institucionalização dos NEAs e CVTs, a situação das universidades é preocupante. Segundo Altino Bonfim, coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Agroecologia em Rede/Agrorede da UFBA e do comando de greve local, “está em curso um projeto amplo de privatização das universidades públicas associada à terceirização. O recente corte de recursos da pós-graduação de 75% é um fato concreto que, segundo o professor teria duas implicações: a progressiva cobrança pelos cursos de pós-graduação e a crescente necessidade de buscar financiamentos da iniciativa privada, onde a pesquisa passaria a atender, principalmente, aos interesses do mercado”. Neste contexto, de sucateamento do ensino público superior que a RENDA/NE se constitui, também, como um importante espaço de luta, apoiando a greve dos servidores e professores por uma universidade pública e de qualidade.
De acordo com Mônica Cox, Professora da Geografia (UFPE) e coordenadora do Projeto RENDA/NE, “o seminário é um espaço de firmar as trocas e intercâmbios entre os vários grupos dedicados à construção da Agroecologia nas instituições de ensino, pesquisa e extensão, aprender com as experiências de cada um e nos fortalecer nos processos de construção do conhecimento agroecológico a partir dos núcleos e coletivos em diálogo com a dinâmica social de cada estado. Aí está a “vividez” da rede, da RENDA/NE, construir as tramas dessa renda, formando uma rede que se comunique e balance a partir do movimento nos distintos territórios e daí na região como um todo”, disse a professora Mônica.IMG 6712
De acordo com Mônica Cox, Professora da Geografia (UFPE) e coordenadora do Projeto RENDA/NE, “o seminário é um espaço de firmar as trocas e intercâmbios entre os vários grupos dedicados à construção da Agroecologia nas instituições de ensino, pesquisa e extensão, aprender com as experiências de cada um e nos fortalecer nos processos de construção do conhecimento agroecológico a partir dos núcleos e coletivos em diálogo com a dinâmica social de cada estado. Aí está a “vividez” da rede, da RENDA/NE, construir as tramas dessa renda, formando uma rede que se comunique e balance a partir do movimento nos distintos territórios e daí na região como um todo”, disse a professora Mônica.
Na manhã do dia 02 foi facilitada pela diretora do Centro de Formação em Economia Solidária (CFES/NE), Alzira Medeiros, a oficina “Sistematização de Experiências”. Perguntas como “o que é sistematização? De onde partir e com quem construir esses conhecimentos? Que suportes existem que se aproximam do que pensamos como produção de conhecimento? Como a gente da voz a estes sujeitos que constroem a agroecologia no seu dia a dia?” ganharam centralidade nos debates ao longo da manhã. Os participantes colocaram a dificuldade da academia de se abrir para uma metodologia inovadora. Mayara Melo, do Núcleo TRAMAS/Reaja (UFC), diz que o “núcleo vem trabalhando com sistematização e isto tem sido um exercício de reflexão sobre as próprias práticas. Ela afirma ainda que o processo tem levado a reflexão sobre a construção com os movimentos sociais e afirmação do diálogo dos saberes”.
Para Alzira Medeiros, “a sistematização tem por objetivo construir novos conhecimentos, reconhecendo ou referendando saberes invisibilizados, onde os sujeitos, muitas vezes, não possuem consciência do seu próprio conhecimento. Para a sistematização todos os saberes são conhecimentos e a pesquisa se insere também no campo da militância num processo contínuo de ação e reflexão”.IMG 6692
Para Alzira Medeiros, “a sistematização tem por objetivo construir novos conhecimentos, reconhecendo ou referendando saberes invisibilizados, onde os sujeitos, muitas vezes, não possuem consciência do seu próprio conhecimento. Para a sistematização todos os saberes são conhecimentos e a pesquisa se insere também no campo da militância num processo contínuo de ação e reflexão”.
A professora Maria Virgínia Aguiar do Núcleo de Agroecologia e Campesinato (NAC-UFRPE) e da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), afirma que já “estamos organizados e organizadas em Rede e devemos valorizar nossas experiências para avançar, compreendendo principalmente que a comunicação é um processo importante para isto e, que tem dois movimentos: para dentro e para fora”. Nesse sentido, um primeiro passo foi dado na construção de uma agenda estratégica onde os NEAs e CVTs intercambiaram as atividades que irão realizar, tais como seminários, caravanas agroecológicas e culturais, cursos de formação, encontros estaduais, entre outras, além disso uma comissão de comunicação ficou responsável por agregar e sistematizar as informações do que já vem sendo feito, dando prioridade neste momento em firmar a comunicação em rede.
Ao final do encontro os participantes se chamavam por rendeiros e rendeiras, demonstrando que o Seminário RENDA/NE foi o início de convergências de ideias, intercâmbios de experiências, reconhecimento e afirmação da Rede. O desafio está posto, a rede já está balançando como brincaram alguns participantes e aos poucos as mensagens que iam chegando: “Paraíba na estrada, cheia de amor e gratidão!”; “povo da Bahia no aeroporto, após este lindo encontro que renova nossas esperanças!”; “Maranhão na estrada!”; “gratidão pelos aprendizados!”, traziam a clareza de que construir agroecologia nos IES perpassa também por momentos como estes. Assim terminou o seminário, com animação e disposição para o próximo encontro da RENDA/NE que já está próximo: Rumo IX Congresso Brasileiro de Agroecologia em Belém do Pará.