Por Riquieli Capitani
Da Página do MST

Dos compromissos com a terra e com a vida firmados pelo MST, dois deles são a produção de alimentos para eliminar a fome da humanidade, evitando a monocultura e o uso dos agrotóxicos, e também o aperfeiçoamento dos conhecimentos sobre a natureza e a agricultura.

 

Nesse sentido, as famílias do Assentamento Contestado, localizado no município da Lapa (PR), trabalham na produção de alimentos agroecológicos, de qualidade e acessíveis à população, além de buscar a melhoria da qualidade de vida. E, para organizar a produção, industrialização e comercialização, foi fundada em 10 de abril de 2010, no Assentamento, a Cooperativa de Agroindústria e Comércio Terra Livre.

 

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Atualmente a Cooperativa conta com 266 cooperados, destes 215 residem no município da Lapa (80,85%), outros 46 camponeses residem no município de São Mateus do Sul (17,45%) e cinco residem no município de Antônio Olinto (1,70%).

“Desse número total, 131 cooperados são assentados e assentadas da reforma agrária, com destaque para os jovens, que representam 25% deste total e que buscam na Cooperativa uma opção para a sua autonomia e a sua emancipação no meio rural”, comenta Daniel Kramer Schwiderke, integrante da coordenação da Cooperativa.

Os agricultores e agricultoras familiares somam 122 cooperados, que visualizaram na Cooperativa Terra Livre uma opção para se desvincularem da produção de culturas convencionais como a produção de fumo e de grãos. Além destas, há um grupo de treze famílias quilombolas que estão associadas à Terra Livre.

A produção agroecológica é a meta de todos os cooperados. A certificação desta produção é realizada de forma participativa pela Rede Ecovida. Hoje, 37,96% dos produtores já são certificados e cadastrado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Os demais cooperados se encontram em processo avançado de transição agroecológica.

As principais formas de comercialização desenvolvidas pela cooperativa Terra Livre são através dos programas institucionais. Dentre estes programas, a principal forma de comercialização é através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

Para este ano, a Cooperativa Terra Livre desenvolverá duas Cédulas de Produto Rural (CPR’s) na modalidade Compra com Doação Simultânea em conjunto com a Companhia Nacional de Abastecimento.

A CPR de número PR/2014/02/0062 conta com a participação de 69 agricultores e agricultoras, que produzirão ao todo 202.623 quilos de alimentos orgânicos com o valor de R$ 551.954,25.

Já a CPR de número PR/2014/02/0063 conta com a participação de 122 agricultores e agricultoras, que produzirão ao todo 661.238 quilos de alimentos em transição, somando assim o montante de R$ 975.964,40.

As duas CPR’s de representarão 863.861 Kg de alimentos saudáveis e somaram R$ 1.527.918,65 de recursos no ano que serão revertidos para os agricultores e entidades beneficiarias.

Neste total, serão produzidas 31 diferentes tipos de hortaliças, frutas e legumes. As principais culturas que serão produzidas são, abóbora seca, milho verde, alface, repolho, almeirão, cheiro verde, cenoura, brócolis, beterraba, couve manteiga e a abobrinha verde.

Todos estes alimentos são levados para o Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo (Cefuria). Uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos, criada no ano de 1981, cuja finalidade é fortalecer a organização popular, as lutas do povo por melhores condições de vida, construir o protagonismo popular, contribuir na formação da cidadania plena.

As principais áreas de atuação que o Cefuria desenvolve ações, são o acompanhamento e trabalho com catadores de materiais recicláveis, o fomento aos clubes de troca, o processo de formação em economia popular de trabalho, o incentivo e organização de feiras de economia solidária, ações voltadas à segurança e soberania alimentar e o incentivo à criação e funcionamento de padarias comunitárias.

Segundo Antônio Carlos Bez, membro da coordenação do Cefuria, a parceria entre agricultores e entidades que já dura mais de quatro, atende seis municípios.

“São mais de 5 mil pessoas que receberem essa produção, e essa pessoas estão e são de creches, casas de apoio, igrejas, que compõem basicamente seis municípios: Pinhais, Piraquara, Almirante Tamandaré, Colombo, Campo Largo e Curitiba. São 35 entidades filantrópicas credenciadas junto ao Cefuria”.

Assim, juntando diferentes atores sociais, de um lado as agricultoras e agricultores da Reforma Agrária, da Agricultura Familiar e de Famílias Quilombolas e de outro mulheres, crianças, jovens e idosos em situação de vulnerabilidade social e em situação de insegurança alimentar é possível garantir o acesso e a participação de agricultores familiares ao mercado.  A geração de renda, a preservação do meio ambiente, a superação da condição de insegurança alimentar, o acesso a uma alimentação saudável, o estimulo de hábitos alimentares saudáveis, sempre em conjunto com o controle social em todas as etapas de seu desenvolvimento, também estão garantidos.

 

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Além do PAA, outra forma de comercialização da produção dos assentados, será pela agroindústria construída através de recursos das próprias famílias do assetamento. No espaço serão feitos o processamento dos alimentos produzidos pelos agricultores.

Toda a agroindústria foi construída pela contribuição de cada família, e pela mão de obra dos próprios assentados. E os equipamentos foram adquiridos através do Incra, pelo programa Terra Forte. “Os 31 diferentes tipos de hortaliças, frutas e legumes que são produzidos aqui serão processados nessa agroindústria, nós faremos conservas, molho de tomate, também vamos embalar alimentos, faremos o corte de verduras, e além disso nós também teremos a panificadora”, acrescenta Kramer.

No Assentamento também funcionará uma usina compacta de produção de óleo vegetal. “Nós temos equipamentos que podem extrair o óleo vegetal da soja, do girassol ou do amendoim. Ela tem capacidade para produzir 50 litros de óleo por hora, e vamos focar no óleo comestível. Em breve ela estará funcionando”, conclui.

História

No dia 7 de fevereiro de 1999, 40 famílias da região de Curitiba, Balsa Nova, Lapa e outras regiões do Paraná, ocuparam a Fazenda Santa Amélia, localizada a 70 quilômetros de Curitiba, da capital paranaense (na foto ao lado).

Conquistar a terra, poder produzir e sobreviver da sua produção, ter acesso a educação, cultura e saúde eram os objetivos daquelas famílias.

A fazenda que até então pertencia ao grupo Incepa, empresa produtora de cerâmica, que contraiu dividas com bancos. Em dezembro de 1991, após alguns meses da ocupação, foi destinada a fins da Reforma Agrária, assentando 108 famílias.

A área passou a ser conhecida como Assentamento Contestado, uma homenagem das famílias sem terras aos trabalhadores rurais que lutaram na Guerra do Contestado (1916 à 1992).

Educação

Além de ser destaque na produção, o assentamento também demonstra sua força na organização da educação, pois conta com todos os níveis de ensino educacional, desde o ensino de educação infantil, à graduação. Nem sempre foi sempre. Só depois de 13 anos de muita luta foi construída a Escola Municipal e o Colégio Estadual Contestado.

Em 27 de agosto de 2005, foi implementada a Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA) na sede do assentamento. Fruto de uma iniciativa entre a Via Campesina, com apoio do governo estadual do Paraná e pelo Instituto Federal do Paraná, além do apoio do governo da Venezuela, a escola promove a formação de jovens, oriundos de comunidades camponesas e movimentos sociais da Via Campesina, no curso de graduação Tecnologia em Agroecologia.