A Caravana Agroecológica e Cultural da região Sul encerrou suas atividades em Curitiba (PR), na última quarta-feira (20), lembrando os nomes dos agricultores que foram presos no Paraná acusados de desvio de recursos do Programa Fome Zero, do Governo Federal, por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Os agricultores e organizações criticam a criminalização dos movimentos por parte do governo, e acreditam que seja uma pressão dos setores do agronegócio junto a mídia para enfraquecer as organizações populares do campo.
Segundo Darci Frigo, da coordenação da ONG Terra de Direitos, essas pessoas que foram criminalizadas e estão figurando nas ações criminais na verdade estão tentando viabilizar a agricultura familiar no estado do Paraná.
“Ainda tem quatro pessoas presas. É todo um esforço dos agricultores para viabilizar a conquista da sua renda e tentar inclusive trabalhar para que se possa concretizar o programa, que tem uma série de defeitos na sua norma. É preciso construir uma unidade e tentar romper esse processo de perseguição. Esses programas são uma conquista histórica, mas estão sendo criminalizados. Precisamos enfrentar os problemas e exigir das autoridades que mudem as normas para sua execução”, disse.
A caravana foi mais um passo rumo ao III Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), previsto para maio de 2014 em Juazeiro (BA), e teve de mudar sua rota por conta desses problemas relacionados aos agricultores do Paraná, explicou Marcelo Passos, da ONG Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia (Aopa).
“A caravana do sul era para terminar em Florianópolis, mas por conta dessas questões que aconteceram no Paraná com o PAA e Conab avaliamos que era importante aprofundar esse debate e mostrar nossa posição. Também havia um seminário nacional de mulheres com uma avaliação do PAA num dos temas, então preferimos nos juntar a elas. E a Terra de Direitos fez um seminário sobre os direitos dos agricultores e seus riscos, então juntamos tudo isso numa engenharia complicada e fizemos relatos das experiências nas rotas visitadas”, afirmou.
A agricultora Noemi Krefta, do Movimento das Mulheres Camponesas (MMC), lembrou que esse processo preparatório deu mais ênfase à participação da base das entidades. Nesse sentido, explicou, ocorreram visitas às experiências nas caravanas para dar consistência e visibilidade ao acúmulo da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).
“A mídia diz que são pequenos nichos, mas se nós somarmos todos os pontos que temos e visibilizá-los vamos saber que temos muita coisa. Junto com esse trabalho das ações práticas da produção dos alimentos e o cuidado com a biodiversidade temos que fazer a luta de enfrentamento, precisamos de políticas públicas que nos deem sustentação. Trabalhar os direitos dos agricultores e agricultoras está dentro desse processo da agroecologia que a gente quer, e essa questão do PAA é uma pressão do agronegócio que tenta destruir as organizações populares que estão buscando recursos para suas iniciativas”, criticou Noemi.
Relatos das caravanas
Na rota de Erexim, no interior de Santa Catarina, foram realizados debates sobre dinâmicas de abastecimento, circuitos de comercialização da Rede Ecovida, dentre outros temas norteadores das atividades. Construir estratégias para gerar uma sinergia entre os agricultores e a economia solidária, distribuição e comercialização nas cidades, foi uma das abordagens. O acompanhamento e continuidade dos projetos em relação à produção e organização desses diferentes atores também foi debatido. Um dos desafios é criar parcerias concretas entre grupos rurais e urbanos no que se refere ao processamento, distribuição e comercialização de alimentos na dinâmica da agroecologia. Visitaram ainda uma feira de mulheres no município Curitibanos, que está organizada há seis anos. As agricultoras foram conquistando o espaço, que hoje tem barracas organizadas e planejamentos. O principal desafio delas é atrair o público consumidor, pois mudaram o local de trabalho recentemente. São integrantes do MMC e têm o selo da Rede Ecovida para comercialização. Entregam alimentos no PAA e PNAE com o que sobra da feira, e gerenciam todo o processo.
Na rota do litoral catarinense foram realizadas várias visitas a partir do norte rio-grandense até Curitiba (PR). Em Maquiné (RS) conhecemos a atuação da Ação Nascente Maquiné (Anama) com o grupo Saberes da Terra, que trabalha com onze famílias para comercialização vendendo produtos principalmente ao PNAE. Os agricultores enfrentam dificuldades com os atravessadores, que compram alimentos no Ceasa e concorrem deslealmente nas chamadas públicas. Em seguida a rota passou pela Associação das Mulheres para o Desenvolvimento Comunitário de Três Forquilhas (Amadecom), uma iniciativa protagonizada por camponesas em relação à produção da polpa juçara. Elas também entregam para o PNAE, e relataram muitas dificuldades na comercialização por conta do machismo. As cooperativas de consumidores da região também foram visitadas em Três Cachoeiras e Torres, No Rio Grande do Sul. A ONG Econativa também expôs seus projetos com o PNAE e PAA, além das entregas que fazem à rede de supermercado Zaffari, em Porto Alegre. Em Praia Grande (SC), vimos a experiência da Acevam que abastece trinta e oito mercados na região com a produção de bananas. Na ocasião foi explicado como funciona o circuito de comercialização da Rede Ecovida, e a necessidade de fortalecer a dinâmica dos pequenos e grandes mercados.
Sementes Transgênicas
O professor de economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Victor Pelaez, evidenciou a relação dos transgênicos com a utilização de agrotóxicos. Segundo o estudioso, os EUA são os maiores produtores mundiais de transgênicos e as empresas nessa área aumentaram radicalmente seus negócios nos últimos anos. Palaez listou as maiores empresas do ramo (Syngenta, Bayer, Basf, Monsanto, Dow), quase todas produtoras de agrotóxicos que incorporaram o mercado de sementes, e como elas dominam o sistema ao adquirir as empresas menores nos últimos quinze anos.
“Quem está ganhando com o aumento do preço é acima de tudo o produtor de sementes e fertilizantes, e praticamente dobrou o custo. A semente transgênica traz um alto valor agregado que quem acaba se apropriando do excedente não é o agricultor. Essas empresas controlam todo o mercado mundial de sementes, e têm também cerca de 70% do mercado mundial de agrotóxico. A Monsanto começou a produzir transgênicos porque estava com o glifosato sobrando e fez a planta ficar resistente a esse herbicida para vender cada vez mais o produto”, analisou.