Brasília (DF) – Com muita animação e atividades culturais a II Mostra Nacional da Produção das Margaridas acabou na noite te ontem (24), em Brasília. Milhares de pessoas circularam pelo Complexo Cultural da Funarte, onde foram realizados debates e oficinas para as mulheres trabalhadoras do campo. Estandes divididos por estados estavam com os produtos regionais à venda. Cerca de 300 camponesas estavam envolvidas na realização do evento, que tinha como objetivo fortalecer a autonomia política, econômica, e social das mulheres do campo e da floresta.
Os artesanatos típicos das diversas regiões se destacaram, como os de fibra de bananeira, palha de café, escama de peixe e fio dourado, dentre outros. Um que chamou bastante atenção foi o de um assentamento em Mazagão, no interior do Amapá. As artesãs fazem um trabalho de resgate da cultura indígena (Veja aqui), que foi encontrada há sete anos na região. Ezequiele Lima explica que a produção é extraída do próprio barro na comunidade, e as ferramentas são manuais, inclusive o torno, então tudo é lucro. A venda nesses eventos é muito proveitosa, apesar de muitos produtos quebrarem no trajeto, fato que dessa vez lhe rendeu uma perda de cerca de R$ 250,00 em mercadoria, explicou Ezequiele.
“Mesmo assim vale porque no Amapá é mais barato. Com pouca matéria prima fazemos muitos vasos, cofres, panelas de barro, bichos para enfeitar estantes, e o principal são os vasos maracá e cunani, da cultura do nosso estado. Eu já era acostumada com a cerâmica desde pequena, e foi fácil se adequar ao grafismo indígena. E vir a um espaço como este é legal tanto para divulgar o nosso trabalho, como para valorização das mulheres, que têm oportunidade de ajudar muito na questão financeira da família. Eu ganho por evento em torno de R$ 400,00, mas em evento grande dá para tirar até R$ 2 mil”, destacou.
De acordo com Maria Amador, do município de São José da Tapera, em Alagoas, é preciso mais apoio do governo às iniciativas agroecológicas das mulheres camponesas. Ela ajuda na comercialização da pimenta regional, que é plantada por meio de um sistema de irrigação em garrafas pet. Seu produto é vendido nos grandes hoteis da orla de Maceió, e por falta de incentivo e recursos ela não consegue participar de mais eventos para vender seus produtos. Segundo ela, o sistema de hidroponia é muito simples e, após a instalação dos equipamentos, qualquer criança pode controlar.
“Somos em 12 famílias, então é uma associação comunitária, com vínculo na agricultura familiar e várias entidades. Mas as ajudas são muito limitadas. Se eu tenho um convite, por exemplo, para ir ao Rio Grande do Sul, porque em Santa Maria e Canoas tem eventos, eles dão hospedagem, alimentação, tudo, mas a condução tem que ser da prefeitura local que nunca apóia. O nosso objetivo é vender e se organizar, e mostrar que a gente não trabalha mais porque não tem condições. Falta recurso para nós colocarmos um pólo de venda na cidade, falta apoio do governo. A gente precisava de incentivo para o pessoal plantar mais para fornecermos aos consumidores”, afirmou.
Em todas as regiões do país há produção agroecológica. Uma das que estava à exposição na II Mostra das Margaridas foi a da agricultora Jucileide Soares, de Esperantina, Piauí. Ela é secretária de mulheres no sindicato local, e destacou a importância desses eventos para geração de renda das mulheres do campo. Em sua cidade são realizadas feiras agroecológicas a cada três meses, e elas trabalham com corante orgânico, feijão, cebola, tomate, pimentão, macaxeira, dentre outros produtos.
“Temos de tudo um pouco nas nossas plantações agroecológicas no Piauí. Um evento como esse gera uma troca de experiências, que a gente tem ao longo do nosso trabalho. O movimento está fraco, mas deve dar para ter uma rendazinha extra de uns R$ 400,00. Trabalhamos na organização da marcha com os nossos grupos organizados, que vêm desde a base até aqui em Brasília a nível nacional. Nos organizamos para conquistar mais direitos para as mulheres. Por isso, o nosso objetivo é preparar sempre a marcha das margaridas” observou.
Participante pela primeira vez de um evento como a Mostra, Lucivania dos Santos, de Aquidabã, no Sergipe, disse que é bom trabalhar em conjunto com outras organizações e fora do seu território para gerar renda através da venda de seus produtos. Ela trabalha com bordados de tecidos, os chamados ponto de cruz e rendendê na região, e participa de uma cooperativa local nos.
“Nosso trabalho é feito artesanalmente. Estamos com poucas mulheres ainda, mas pretendemos chegar a outras pessoas para elas começarem a trabalhar e adquirir alguma coisa mais para frente. Só vendemos em Aquidabã, mas como a renda é pouca estamos buscando esses eventos para sustentarmos nossas famílias. Politicamente acho que precisa melhorar um pouco mais, principalmente na ajuda ao trabalho porque a mulher ainda sofre muito com a discriminação. Ainda precisamos de muita ajuda dos governantes. Tem muito trabalho acontecendo, mas que não geram uma renda suficiente para sustentar a família”, observou.
Apesar de a chuva prejudicar a circulação de pessoas no sábado, no último dia da Mostra muitas pessoas transitaram no evento e as vendas melhoraram. Solidária à Marcha das Margaridas desde o início, Lucia Helena Castro, psicoterapeuta corporal e ecóloga, elogiou a iniciativa. Ela fez algumas compras, e acha que é importante divulgar mais esse tipo de produção para que o consumidor perceba a diversidade e qualidade dos produtos locais desenvolvidos em todo o Brasil.
“Comprei um objeto maravilhoso que dificilmente encontraria aqui em Brasília, e talvez custasse algo em torno de três vezes a mais do valor que eu paguei. Eu não conseguiria essa maravilhosa esteira, que pode substituir perfeitamente aquele objeto plástico para yoga. Realmente existe um diferencial, tem coisas regionais muito especiais e a compra direto com o produtor também é um fator essencial. Mas eu achei a produção aqui um pouco limitada, não tem muitas coisas. Talvez elas tenham problema com a certificação de orgânicos, que é muito difícil”, concluiu.