Brasília (DF) – A agroecologia sob o ponto de vista da participação das mulheres na sustentabilidade e organização produtiva da agricultura familiar foi tema na manhã de hoje (22), no Seminário Nacional da Mostra das Margaridas, em Brasília. Lideranças de movimentos relataram a importância desse modelo de desenvolvimento hoje. O dia internacional da água também foi lembrado. Ocorreu um minuto de silêncio, no momento em que foi anunciado o assassinato de uma camponesa sindicalista baleada com sua filha no Mato Grosso do Sul nesta manhã.
A II Mostra da Nacional da Marcha das Margarida é mais um momento de coragem e renovação, que serve também para dizer o quanto e como as mulheres estão trabalhando a agroecologia, avalia Carmen Foro, secretária de mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). Ele lembrou que desde o ano 2000 a Marcha das Margaridas traz com muita força a pauta da agroecologia, questionando o atual modelo de desenvolvimento.
“A marcha tem questionado o atual modelo, com uso excessivo de agrotóxico, contaminação dos alimentos, envenenamento dos rios, concentração de terras. Defendemos um modelo de defesa dos bens comuns da humanidade, terra, água, sempre tentando valorizar o papel que as mulheres têm na agricultura familiar. A agroecologia é nossa estratégia de desenvolvimento”, afirmou.
A Contag, segundo ela, tem participado pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) na construção da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, que foi decretada pela presidenta Dilma Rousseff no dia 20 de agosto de 2012 e está em processo de formulação de seu plano. Isso tem refletido, na sua opinião, no reconhecimento por parte do governo ao modelo agroecológico promovido e reivindicado pelas lutas populares das mulheres camponesas. “O centro dessa conversa é o combate ao uso de agrotóxicos. E a assistência técnica pública voltada para o projeto dos agricultores familiares. É preciso também discutir o uso da terra e da água articulados. O enfrentamento é pesado com uma disputa muito desleal, pois eles têm utilizado a mídia a seu favor, descontruindo um processo que levamos muito tempo para concretizar”, criticou.
A Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) reúne há dez anos movimentos e organizações que têm a agroecologia como sua pauta de luta, explicou Beth Cardoso, do setor de mulheres da ANA. É um termo, complementou, que veio dar nome à agricultura que as camponesas sempre fizeram tradicionalmente.
“O que veio atravessando no meio do caminho da agricultura foi o agronegócio. A revolução verde é o contrário da ecologia, chega na década de 70 ao Brasil dizendo que é impossível plantar sem usar agrotóxicos, trator, etc. Somos o país que mais consome venenos no mundo, uma média de 5 litros por pessoa ao ano com um impacto brutal na saúde. As mulheres na maioria das vezes se recusam a isso, são as guardiães da biodiversidade”, observou Beth .
A militante defende a modernidade da agroecologia, explicando que um dos seus princípios é a diversidade. Ela exemplifica nos quintais cuidados pelas camponesas, nos quais há uma infinidade de verduras, frutas, e animais para a alimentação e renovação dos nutrientes da terra. “Não compram adubo e veneno para sua plantação. Aprenderam a tirar aquela planta no mato e transformar em cultivo, resgatam o conhecimento tradicional, como nas plantas medicinais, passado de geração em geração. Uma contribuição importantíssima para agricultura, que muitas vezes não é valorizada. Existe interesse que o controle fique na mão das grandes empresas do mercado. Aquela pulverização mata os agricultores, e depois quem limpa aquele veneno da roupa no tanque é a mulher: é preciso brigar por isso”, alertou.
Nos trabalhos realizados pela ANA, concluiu a integrante do movimento, são sistematizadas experiências de mulheres que apontam para a importante contribuição das camponesas na transição agroecológica. São elas, disse Beth, que mais se preocupam com os alimentos e quando seus trabalhos começam a gerar renda são multiplicados e convertem os camponeses nas regiões.
As camponesas da Paraíba contam com o apoio do Polo da Borborema, que articula os camponeses, as assistências técnicas e movimentos em vários municípios do estado. Maria do Céu de Santana, da comissão de mulheres do Polo, afirma que desde 1993 a agricultura familiar tem se organizado na região. A valorização do conhecimento local das mulheres e a agroecologia são os princípios que norteiam a trajetória do movimento, complementou.
“Realizamos visitas de intercâmbio, e valorizamos o papel das organizações como motor do desenvolvimento sustentável. A agroecologia é a base da construção desse processo de autonomia e justiça. Muitas mulheres a partir desse conhecimento têm crescido e construído caminhos de superação e mudança na relação de poder com os homens. Temos feito estudos que servem como monitoramento da renda. Temos afirmado, ainda, a capacidade e criatividade dessas mulheres, com fundos rotativos solidários dos pequenos animais, fogões ecológicos, guardiães das sementes gerindo bancos comunitários da região, feiras agroecológicas, e acessos ao PAA e PNAE”, destacou.