Ocorreu na última quinta-feira (10), no Rio de Janeiro, a reunião do grupo que está organizando a comunicação da Cúpula dos Povos. Pablo Kunich, venezuelano da Articulação de Movimentos Sociais hacia el ALBA e da Alba TV, e Rita Freire, articuladora da Ciranda e uma das organizadoras do Fórum Mundial de Mídia Livre, disseram que o principal papel da mídia livre será expressar a voz popular durante o evento. Segundo eles, é uma responsabilidade política de todos romper com o cerco midiático. A afirmação vem no mesmo dia (11) em que o jornal O Globo culpa os moradores de rua, que estão em parques públicos cariocas, por deixar a cidade mais feia para a Rio+20.
O que é fundamental na comunicação da Cúpula dos Povos?
Rita Freire (RF) – Está muito claro que todo o processo de comunicação da Cúpula dos Povos está orientado por um conceito construído pelo movimento ativista da comunicação. Não será uma comunicação convencional, voltada para as grandes mídias, esquece! Será uma comunicação com uma alma tanto do movimento social quanto do próprio movimento da comunicação. É o conceito da comunicação compartilhada, em que comunicadores e comunicadoras estão atentos às questões trazidas pela sociedade civil. Eles fazem sua produção, mas compartilham entre si para produzir conteúdos coletivos. Acho que a reunião avançou na construção da TV Cúpula, que se baseará nesse conceito e terá produções prévias e muita produção viva nas próprias atividades. A rádio Cúpula também, e muita produção dos movimentos sociais, com convivência na construção da cobertura durante o evento. O principal papel da mídia livre vai ser o de expressar a voz popular, da sociedade que se mobiliza e não é a mesma em discussão na Rio+20. Nesta é o ponto de vista de governo e do poder econômico, que estão procurando ajuste para a grande crise. Mas as emergências da sociedade não estão sendo discutidas lá, muito menos os sonhos dos povos.
O movimento de comunicação vai para a Cúpula não só fazer cobertura, vai discutir a sua realidade, o que é a comunicação no mundo e o que ela tem a ver com os bens comuns, mudança de modelo, democratização. Nos dias 16 e 17 haverá o debate do Fórum Mundial das Mídias Livres, que contribuirá na assembleia na discussão da mercantilização da vida e bens comuns. Traremos o debate da comunicação como um bem comum cultural da humanidade.
Pablo Kunich (PK) – É importante também entender que essa cobertura será realizada pelos meios alternativos, comunitários e populares, mas também que a comunicação não é apenas um problema de jornalistas e comunicadores: é um problema político central para o movimento social. Na Cúpula dos Povos vamos enfrentar o capitalismo em crise, mas que resiste a cair. E nessa resistência a comunicação é fundamental na luta dos movimentos. Não vai ser só uma cobertura, e sim uma mobilização, espaço de encontro, e com essa mesma metodologia entendemos a comunicação: uma possibilidade de compartilhamento, de articular experiências brasileiras, da América Latina, Europa e África. A Cúpula pode ser uma experiência para avançar nesse movimento de melhorias, porque também assumiu a responsabilidade que os movimentos têm em assumir sua própria comunicação como parte de da luta política. Fazemos comunicação porque falta terra, direitos humanos de milhões. Do ponto de vista estratégico, está prevista uma transmissão por internet via site da Cúpula, na rádio, os meios livres também com seus próprios produtos, além das traduções.
Com será a estrutura de comunicação?
RF – Teremos na Cúpula alguns espaços para edição de conteúdos audiovisuais, onde as pessoas vão poder contribuir com seus registros da Cúpula. Serve de documento, o que estiver registrado e não entrar na TV Cúpula faz parte de um acervo interessante. Todo o conteúdo da Rede dos Povos (http://cupuladospovos.org.br/2012/05/conheca-a-rede-dos-povos-a-plataforma-colaborativa-da-cupula/), um laboratório com plataforma compartilhada, deve ser bem divulgado. Alguns programas sobre resistência já estão em processo: um do quilombo da Pedra do Sal, outro da ocupação indígena do Museu do Índio ao lado do Maracanã e a construção da siderúrgica TKCSA. Vai ter também a visita dos inuítes, que quer dizer nosso povo, ao invés de esquimós, que moram no Alaska, aos povos indígenas. Vai ter um programa sobre eles.
PK – Vai ter também uma cobertura especial sobre o acampamento da Via Campesina, porque é uma das articulações mais importantes, dentro outras coberturas desse tipo de espaços, como a Marcha Mundial de Mulheres. É importante dizer que o processo de comunicação não vai começar na Cúpula, já estamos trabalhando na cobertura, preparando os movimentos sociais, destacando quais são os posicionamentos, críticas ao capitalismo e alternativas que estamos pleiteando. Isso é fundamental. E a responsabilidade política de todos os setores da comunicação de posicionar as alternativas que temos ao capitalismo, ao invés de ficar só criticando. Está funcionando um boletim periódico da Cúpula, e os setores de comunicação dos movimentos sociais também estão fazendo boletins próprios. Uma rede ampla que já está trabalhando. E vale destacar dois momentos importantes: dia 05 de junho, dia do meio ambiente, e 20 durante a Cúpula, que serão dois momentos de mobilização mundial que já estamos promovendo.
A programação já está fechada?
RF – Todas as informações estão no site (http://cupuladospovos.org.br/). Nos dias 17 e 18 estaremos cobrindo as assembleias de convergências, que serão momentos de construção de toda essa leitura que a sociedade civil e os movimentos trazem para Cúpula. Vamos sistematizar as propostas da sociedade, e depois isso tudo vai compor o documento da Cúpula. Então é um momento ímpar, porque você vai ter 5 eixos: justiça social e ambiental e a luta por direitos; mercantilização da vida em defesa pelos bens comuns; soberania alimentar; indústria extrativista e mineração; trabalho com os paradigmas.
PK – Estamos vendo a possibilidade de se transmitir a assembleia ao vivo, é uma forma de democratizar um pouco mais a participação e ampliar o debate. Também foi citada a transmissão como um mecanismo de defesa, por causa da militarização da cidade e a possibilidade de repressão aos movimentos durante as mobilizações, como na Vila Autódromo, no início da Cúpula.
Tem mais alguma coisa a destacar na cobertura?
RF – Também deve ser coberta como a população está vendo a Cúpula, de que forma a própria conferência Rio+20, o primeiro dos grandes eventos que o Rio vai abrigar, está impactando a cidade. Esses eventos estão exigindo da cidade uma reorganização, e como a população mais indefesa frente o poder de eventos como esses foram afetadas. Acho que isso tem que aparecer também, porque é um encontro sobre meio ambiente e direitos das pessoas. Muitas notícias mostram como as pessoas estão sendo afetadas, expulsas, as políticas de limpeza da cidade, que significa muitas vezes limpar a cidade da vida humana. Então essa é outra orientação da cobertura.
PK – A proposta é que todos tragam uma câmera, gravador, twitter, para uma possibilidade política de romper a barreira midiática. É uma responsabilidade política de quem estará colaborando nesta cobertura, que está articulada e tem diferentes plataformas trabalhando em conjunto. Está Cúpula que entra em contraste com a outra, que é a da minoria, a nossa será a dos mais, os mais pobres também, etc. Mas os comunicadores terão essa tarefa militante de romper esse latifúndio da mídia, que existe no Brasil e no mundo.
RF – A localização e forma de participar das atividades, temas, agendas das reuniões de pauta que teremos em conjunto, vão estar no site da Cúpula dos Povos. Toda a informação da comunicação e de como a mídia alternativa e os movimentos vão trabalhar está no site.